terça-feira, 11 de novembro de 2008

CONSCIÊNCIA NEGRA.

Salve amigos e amigas. Enfim chegamos no mês de Novembro e o ano de 2008 já está com o pé na cova. Entre as conquistas desse ano podemos destacar a chegada de Barack Obama à presidência dos Estados Unidos. Um negro à frente da presidência de um dos países mais racistas do mundo. As coisas estão mudando.

Nessa edição de novembro voltamos a bater na tecla da Consciência Negra. A escravidão acabou? Na música Us Guerreiros o rapper Rappin Hood afirma: “A escravidão não acabou é apenas um sonho / Tem alguns brancos controlando o dinheiro do mundo...”. Nas páginas a seguir confira a entrevista com Erivelto Martins da Silva da quebrada da Vila C; veja lançamentos do Rap Paranaense; o resultado da campanha do Movimento 4p; a polêmica do álbum do rapper norte-americano Nas; e diversas outras informações.

A Família do Fanzine do Cartel está crescendo, estamos estreando dois novos colunistas. Pedro Almeida, que já escreveu na edição passada, trará nas edições seguintes informações sobre a Dança de Rua. Pedro, que é responsável pela Urban Way (Foz e Itaipulândia) é estudante de dança e arte-educador. Nosso outro colunista é Willian Leonel Durda com seus quadrinhos, que também já estreou na edição passada. E também estaremos publicando nas edições seguintes, no quadro poesias e pensamentos, poesias da poetisa Mysk de Foz do Iguaçu.

Boa leitura pra todos e fiquem na paz... Se a luta é pela paz, tamo junto!!!

APOIARAM ESSA EDIÇÃO DO FANZINE:


ALIADOS DA PERIFERIA - 13 DE DEZEMBRO - OTROPLANO




Uma Arte: Willian Leonel Durda


CARGA PESADA. (Por: Mano Adão)

Surge no horizonte vindo de um lugar distante, um lugar que eu não conheço, que só vi falar por TV ou livro. Trazendo uma carga que eu desconheço, nem mesmo sei o que é. Atravessando os oceanos, sem destino, eu continuo pensando: o que é aquela carga tão secreta e importante que teve muito sofrimento?
Alguns por riqueza, outros por prazer.
Por vários dias, várias semanas, vários meses, chega a seu destino.
Encosta na beira da praia, aí começa a descer aquela carga.
Uma carga que anda, uma carga que tem pensamento, uma carga que tem família, uma carga que fala e que não queria estar ali.
Que veio contra a vontade.
Mas essa carga mudou o lugar, trazendo cultura, amor, amizade, riquezas naturais... E também se apaixonou pelo lugar.
Os meus avós, meus pais, meus parentes, meus amigos e eu mesmo somos descendentes.
Em minha verdade tenho orgulho de ser um cidadão de cor, um negro.
Onde ela passa todo mundo fica ouriçado, não sei se por medo ou por respeito.
Quando chegar o dia de se unirem para o bem, vai ser difícil de derrubar essa muralha porque nós somos “CARGA PESADA”.

(Mano Adão é B.Boy em Foz do Iguaçu).

Us Guerreiros (Rappin Hood)


*Dedicado a Martin*

Os herdeiros, os novos guerreiros
Novos descendentes, afro-brasileiros
Na periferia, lutam noite e dia
Tão na correria como vive a maioria

Guardam na memória, uma bela história
De um povo guerreiro, então, cheio de glória
ZUMBI, o líder desse povo tão sofrido
Que sem liberdade pro quilombo eles fugiram

Palmares, o local da nossa redenção
Pra viver sem corrente, sem escravidão
DANDARA, que beleza negra, jóia rara
A linda guerreira comandava a mulherada

Faz tempo, hoje em dia é outro movimento
A luta dos mais velhos amenizou o sofrimento
Escuta, acorda pois não acabou a guerra
Você infelizmente nasceu no meio dela

Já era, o nosso povo vive na favela
Enquanto o colonizador só usufrui da terra
Vitória é o que eu desejo pra minha criança
Tenha sua herança, você é nossa esperança

Refrão:

Só os favelado, só os maloqueiro
US GUERREIRO, US GUERREIRO
Na África de antes, os príncipes herdeiros
US GUERREIRO, US GUERREIRO
Só os aliado, só os companheiro
US GUERREIRO, US GUERREIRO
Eu mando aqui um salve pras parceira e pros parceiro
US GUERREIRO, US GUERREIRO

Palmares era assim, um lugar bem sossegado
Os preto lado a lado, tudo aliado
A mística, o sonho de rever nossa mãe África
Angola, Nigéria, Zimbábue, Arábia

Tudo acorrentado dentro de um navio
Tomando chibatada até chegar no Brasil
Mais de 500 anos depois pouco mudou
ligou? Na verdade só o tempo passou

Naquele tempo tinha o capitão do mato
Que era o mó traíra, tremendo atrasa-lado
Ficava na espreita, pra ver quem fugia
Muito parecido com quem hoje é a polícia

Se liga, muitos morreram pra você viver
Orgulho tem que ter, responsa e proceder
Vai vendo, curte pois você ainda é pequeno
Ainda é criança e não sabe do veneno

Menino, você é o futuro desse jogo
Pra resgatar de novo, a honra desse povo
Quando fizer 18 você vai se alistar
E vai se preparar para guerra enfrentar
Então se liga

Refrão

Persiste, pra entrar pro pelotão de elite
Um grande guerreiro é aquele que resiste
Que não desiste mesmo na adversidade
Que bate de frente pela sua liberdade

Axé, Jesus com nós pro que der e vier
Pois é, tem gente que não bota uma fé
Não acredita que somos todos irmãos
Não acredita que o sangue é igual

É nesse mundo que você irá viver
Você tem de aprender a se defender
Tem de saber, que não há nada errado
Com seu tom de pele, seu cabelo enrolado

Fica ligado que eles querem te arrastar
Com drogas, dinheiro, bebida, mulher
Querem fazer uma lavagem em sua mente
Querem que você seja um cara inconsciente

Tipo um demente, uma marionete
É isso que o sistema quer do negro quando cresce
A escravidão não acabou é apenas um sonho
Tem alguns brancos controlando o dinheiro do mundo

Tem alguns negros guerreando contra todos e tudo
E alguns manos nas ruas querendo roubar um banco
Não seja um tolo, amante do dinheiro
Batalhe dia a dia, pois você é um guerreiro

Refrão

Sabe Martim, o mundo não é como você pensava meu neguinho.
Papai Noel?! É seu pai, negô.
então vai, se cobre aí, se cobre aí
dorme, dorme, dorme...


O NEGRÃO GANHOU! (Por: Deí)

Anotem essa data: 05-11-2008; o dia em que Obama se tornou o 1º presidente negro dos EUA. Para os negros isso significa um marco na história; para muitos brancos, isso pode não cheirar, nem feder; mas para os racistas, isso significa uma derrota cultural de seus valores. Legal! Pois é, amiguinhos, o candidato democrata, Barack Obama, venceu com uma superioridade esmagadora de votos sobre o candidato republicano John McCain. A partir de agora, o homem mais poderoso do mundo é um negro. Peraí!? A desculpa dos idiotas racistas para não aceitarem os negros de igual não era a nossa suposta inferioridade - perante os arianos - (raça supostamente pura)? Se somos inferiores, segundo eles, racistas, qual seria a justificativa sobre a vitória de Obama, negro, em cima de um candidato branco? Se você não sabe, eu respondo. Primeiro que negros, brancos, amarelos e vermelhos não são raças diferentes, e sim povos. A raça é humana. Como já ouvi da boca do dj KL Jay, - o termo raça, entre os humanos, foi usado apenas para nos dividir -. Já o termo ariano, usado entre os teóricos do racismo alemão para identificar os europeus brancos como uma raça superior, não existe. A diferença mais marcante entre brancos e negros está na melanina, apenas. Dizem os estudiosos que o primeiro humano, o Adão bíblico, era negro e que a pele de seus descendentes africanos foi clareando de acordo com as mudanças regionais e climáticas.

Durou cerca de mil anos até que surgissem os primeiros brancos. Resumindo, todos, brancos, negros e demais cores, tem um pé na sala e outro na senzala. Mas o racismo contra negros, originário de uma má interpretação bíblica em meados do século XV, através do papa católico Nicolau V, com apoio massivo da igreja católica, se instalou de uma forma violentamente cultural entre várias famílias escravistas até os tempos atuais, como um câncer. Muitos fazem vistas grossas para esse detalhe histórico, por causa da igreja, que ainda tem poder político sobre seus fiéis, mas todo o cidadão negro tem esse direito de saber! Foram mais de 350 anos de escravismo apoiado pela igreja (éramos sub-humanos para os católicos) e quem ainda perde com tudo isso somos nós, negros! A escravidão, no papel, acabou, mas na prática é outra história! Ta mais do que provado que negros e brancos só se diferenciam no aspecto cor, mas ainda temos que ser duas vezes melhores do que os brancos, para chegar no mesmo lugar. Ainda passamos como invisíveis em cargos superiores, na área empresarial, no mercado de trabalho, etc.; mesmo sendo, segundo algumas pesquisas, a maioria da população mundial. Ainda há muito o que ser conquistado, mas a vitória de Obama, independente de seus planos de governo, mostra que não estamos de brincadeira. A partir de agora, o mundo passará a nos olhar diferente. Mesmo que Obama seja mais um entre a parte podre da política (afinal, política é o que demonstra ser, desde os tempos mais remotos), só pelo fato de ser um negro num cargo executivo tão alto, num país que em menos de 50 anos, vivia uma situação de total segregação racial, já valeu a luta.

Quanto aos racistas de plantão, sendo os infelizes declarados ou não-declarados, só tenho a lamentar por tamanha idiotice. Tinham planos para matarem Obama, nos States, não conseguiram e ele ganhou! Devem estar chorando. Vão ter que comer na mão de um negrão, agora.

(Deí é Dj, rapper e produtor musical em SP).

Fonte: www.rapnacional.com.br

Óia sÓ (Por: Lizal)

Frase de Eduardo Galeano:

Quantas vezes fazemos algo que contraria nossos próprios princípios e idéias? E as contradições não estão apenas nas pessoas. Estão nas instituições, nas entidades, nas organizações... porque estas são feitas por pessoas. Há que se ter cuidado, porém, em distinguir entre contradição e hipocrisia. O neoliberalismo (e seus defensores), por exemplo, diz o que não faz para fazer o que não diz.


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Música do grupo Z'África Brasil:

Só penso na liberdade de Palmares,
ainda há senzalas por todos os lados.
Não se trata somente de viver livre,
mais sim de libertar os ainda escravos

(A escravidão continua).

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A ditadura de 1964 contra os brasileiros - torturou, assassinou, manipulou e inventou em 21 anos uma dívida externa mais de 1000 vezes maior que a de 1964.

(Além de todas as atrocidades ainda temos que ouvir o Raúl Seixas cantando em inglês).


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A festa da UJS que rolou no Otroplano no dia 03 de outubro, que reuniu a galera do rock do rap e do reggae foi sucesso total.

(Hasta La Victória!!!).

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CASSETA E PLANETA

Diante da violência, a sociedade brasileira clama por uma resposta enérgica das autoridades: afinal, seqüestro tem ou não tem trema?

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- Que time você torce?
- Eu torço pelo Gol.

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Barack Obama acaba de tornar-se presidente e já começaram as piadinhas. Cheguei no trampo e um maluco já falou:

- A primeira coisa que ele vai fazer é pintar a Casa Branca de preto.

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É proibido fumar
(diz a canção)
É proibido proibir
(diz o véio deitado)

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Monteiro Lobato escreveu no ano de 1926 o romance O Presidente Negro. O romance é ambientado no ano de 2228 e narra a história de uma mulher e um negro que disputam a presidência dos Estados Unidos. O livro foi relançado no ano passado com um clima de que 82 anos atrás, Monteiro Lobato previu a situação atual dos Estados Unidos. Roberto Pompeu de Toledo escreveu artigo para a revista Piauí dizendo: “No romance O Presidente Negro, a arte não imita a vida nem o marketing: o leitor sai em busca de Barack Obama, mas quem desponta é Hitler”.

(Acessem e confiram:
www.revistapiaui.com.br)

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Assim disse o Nário:

Os espinhos
São pra quem pensa em enganar a flor.

POESIAS E PENSAMENTOS

Se procurar bem você acaba encontrando.
Não a explicação (duvidosa) da vida,
Mas a poesia (inexplicável) da vida.

(Carlos Drummond de Andrade)


Incompleto

No show
O silêncio
Na multidão
O vazio
No escuro
O quarto
No pensamento
Você

(Carol, Foz)

Tempos

Antes te amava
Agora te gosto

Antes te desejava
Agora te quero

Antes te beijava
Agora te espero.

(Carol, Foz)





Reflexos

Caminho descalça
Isenta de tempo
Despida de espaço
Só caminho e caminho
Inativa...
O chão é aspero, mas firme
A cabeça está leve e solta
Caminho descalça
Isenta de tempo

Sublime é o dia
Sublime é a estaçao
As folhas caem
E com elas as duvidas

Eu caminho tranquila
Saio do tempo rumo ao espaço
E faço assim delicada
Meu destino impreciso.


(Mysk, Foz)


Tenho tanto sentimento
Que é freqüente persuadir-me
De que sou sentimental,
Mas reconheço ao medir-me,
Que tudo isto é pensamento,
Que não senti afinal.
Temos, todos que vivemos,
Uma vida que é vivida
E outra vida que é pensada,
E a única vida que temos
É essa que é dividida
Entre a verdadeira e a errada.

(Fernando Pessoa).



FARRAPOS (Gente Feliz)

O homem sorrindo
Sobe no morro
Acena pra foto
Pega no feto
Pede o voto.
Desce de costas
Esquece o fato
Foge da bosta.
Chuta o saco
Cospe no prato
Xinga o feio
Bate no fraco
Que bate na bola
Bebe cachaça
Samba na festa
Trepa na ripa
Enseba no trapo
Que cobre as tripas
De quem dorme em barraco.
Triste fiapo,
Canta contente
No fundo do prato
A fome da gente.

(Sergio Vaz).


PREFEITURA SEM PREFEITO

Nessa vida atroz e dura
Tudo pode acontecer,
Muito breve há de se ver
Prefeito sem prefeitura;
Vejo que alguém me censura
E não fico satisfeito
Porém, eu ando sem jeito,
Sem esperança e sem fé,
Por ver no meu Assaré
Prefeitura sem prefeito.

Por não ter literatura
Nunca pude discernir
Se poderá existir
Prefeito sem prefeitura.
Porém, mesmo sem leitura,
Sem nenhum curso ter feito,
Eu conheço do direito
E sem lição de ninguém
Descobri onde é que tem
Prefeitura sem prefeito.

Ainda que alguém me diga
Que viu um mudo falando
E um elefante dançando
No lombo de uma formiga,
Não me causará intriga,
Escutarei com respeito,
Não mentiu esse sujeito.
Muito mais barbaridade
É haver numa cidade
Prefeitura sem prefeito.

Não vou teimar com quem diz
Que viu ferro dar azeite,
Um avestruz dando leite
E pedra criar raiz,
Ema apanhar de perdiz
E um rio fora do leito,
Um aleijão sem defeito
E um morto declarar guerra,
Porque vejo em minha terra
Prefeitura sem prefeito.

(Patativa do Assaré).


ANJO
Deitado aqui vejo você
De pé translúcida sob a lua
Tua pele nua
Pálida e corada...
Seu rosto escondido
Pelo negro cabelo
E pela timidez aparente
Vem assim devagar
Vem pra mim meu anjo
Pureza e luxuria
Em mais uma noite outonal

(Mysk, Foz do Iguaçu)



UM AMIGO

Lati por que acorrentado não gosto
Farejei os teus passos
Vi você chegar do trabalho
Da escola
E dos ensaios

E aquele pingo de ouro foi você quem cultivou
Vi você regar à tarde
E toda manhã
Me deu alimento e abrigo
Me tirou do perigo
E agora cuido de sua casa e de seu quintal
O mesmo carinho e amor tenho por ti
Por isso que lati

Deitado de seu lado fiquei
Desde pequeno contigo brinquei
Fui buscar gravetos que por ti foram arremessados
Na sua casa
No mesmo gramado
Você se lembra daqueles animais que foram caçados
Dos carrapichos que em meu pelo foram grudados
E por ti é que foram arrancados
Estalas os dedos
Que também tenho sentimentos

(Edson de Carvalho, Foz)

HIP-HOP PARANAENSE


Cartel do Rap ao Vivo

No ano do 8° aniversário, a Banca CDR (Carteldo Rap) lança esse registro histórico. O audio do show foi gravado no Casulo Rock Bar (Bar Underground de Foz do Iguaçu). Os grupos que fazem parte dessa coletânea são: Inimigos da Guerra, Pesadelo Real, Santiago, DNA do Rap, Mano Zeu, Eloquentes, Aliados da Periferia, e Conexão PB. O álbum conta ainda com um freestyle muito loco feito sobre o beat box. Faz seu corre e garanta o seu, a edição é limitada.

Contato: (45) 8417-3726.




Federação Repúbli-k

Diretamente de PG o novo trampo do Federação Repúbli-k.
Babilônia a Pé.
O lado B mais forte que nunca.
No melhor estilo Underground.
Participações:
will no control / Careca, rajada mc´s / Soul kris / Colônia DNA / Vigilia Negra.

Ouça o som:
www.myspace.com/federacaorepublik


Contatos: (42)32221298 / 99322930



Tá nas ruas o CD do grupo Pensamento Racional de Campo Mourão

Na cena desde 2004, Pensamento Racional se destaca pelos temas e abordagens sob o ponto de vista do individuo. Em 2007 o estilo do grupo gerou uma fusão com o rapper Will No Control que já tinha lançado seu álbum "O Dom", sendo amplamente reconhecido no cenário do rap no Paraná. As bases ousadas são produções própria que buscam os elementos da música erudita ao pop para criar o universo de suas produções.
Já tá nas ruas o álbum "Coração de Plástico”
Faz seus corre e garanta o seu.

www.myspace.com/pensamentoracional2008

Contato: 044 9969 5040 - Falar Com Will

FIM DE NOITE (Por Carol)

A vi de perto. Seus olhos verdes cruzaram os meus e me sentenciaram. Essa visão por trás da janela me vinha mais real que antes. Agora percebo que foi mais que uma visão, foi um presságio. Eu estava sentada dentro do ônibus, quando de repente, ela do lado de fora, me fitou com seu olhar ameaçador e me sorriu. Acho que nunca vou esquecer esse riso, uma perfeita mistura de cinismo e maldade num tom de calma. Fiquei com medo. Tentei fugir, sair correndo, mas o ônibus não parou. Puxei a campainha e ele não parou. E ela ali...
Seu manto negro. Seu cajado. Sua tez branca. Seus olhos verdes me seguiram... E nestes mesmos olhos eu me via...

Me lembrei que recentemente sonhei que Deus e Diabo me disputavam como se eu fosse um Rei no tabuleiro. E agora isso... Uma visão, um chamado para atuar em outros planos astrais. Sempre sonhei com um minuto de paz, sem apanhar, sem ser disputada, sem ser mais um ser humano recheado de defeitos. Não consigo mais me concentrar... Tem alguém gritando meu nome... Eu pedi pra ele não fazer isso... Eu ia resolver as coisas... Mãe? E avó? Eu amo você...

De repente tudo pára. O ar muda, os prédios desaparecem depois as casas, depois as pessoas, depois as vozes, depois tudo... Restaram o silêncio e eu...
Eu e o fim da linha...
Na verdade eu sabia que aquela visão era mais que uma visão, era um presságio. Lembrei da adaptação do Marcos Prado no cd do Ultralyrics: “o sangue na rua já está pela cintura... as mulheres choram rios rubros de lágrimas...”

(Carol é estudante de letras em Foz)

MOVIMENTO 4p


O Movimento 4p agradece a todos os que participaram da 4° Campanha de arrecadação de alimentos. Como nos outros anos a campanha aconteceu no dia 12 de outubro no Gramadão da Vila A. Foram arrecadados 283 quilos de alimentos que estão sendo distribuídos para famílias necessitadas.
(Se a Favela está Unida é bem melhor pra nós)

ZUMBI DOS PALMARES


Dia 20 de novembro é o dia da Consciência Negra
em memória a Zumbi dos Palmares.
Zumbi lutou pela liberdade dos negros
e é nosso grande herói negro não reconhecido.
Ele foi assassinado no dia 20 de novembro de 1695.





Questão de classe (parte 1) (Por André Gomes)

“Não é questão de luxo, não é questão de cor, é questão que fartura alegra o sofredor”
(Racionais MC's).

Há anos já se fala no Hip-Hop em revolução, fala-se também que precisamos lutar contra o sistema e contra aquilo que ele nos oferece. Mas pensando bem, que revolução é essa? Como funciona esse sistema que combatemos? A quem serve esse sistema? E principalmente se derrotarmos o sistema, como iremos substituí-lo por outro e qual o outro? Pois é parceiro a caminhada não é fácil não, em primeiro lugar é preciso que os guerreiros e as guerreiras identifiquem que esse sistema que ai está, tem nome, tem dono e tem endereço. O nome é Capitalismo, os donos são as elites econômicas e o endereço central é a Casa Branca nos EUA, a filial brasileira se concentra quase toda nos grandes edifícios luxuosos da Avenida Paulista em São Paulo. Acredito que todos no Hip-Hop já enxergaram que existem dois lados, o da elite que tem acesso a tudo, que tem tudo a seu serviço, e o do proletariado que não tem acesso a nada e que só pode vender sua força de trabalho para aumentar a riqueza do lado de lá, isso sem contar o exército de excluídos que não encontram compradores para sua força de trabalho e vivem o drama do desemprego e do crime. O problema é que muitos dos nossos ainda lutam não para derrotar o lado de lá e sim para passar para o lado de lá, ter os mesmos carros, as mesmas casas, as mesmas minas e os mesmos valores deturpados.
“Sem oprimido sem opressor, sem explorado, sem explorador”- (Face da Morte)
No Capitalismo podemos ter vitórias pontuais e ainda que poucos, podemos ter exemplos de vitória, mas somente superando o sistema e substituindo-o por um outro mais avançado libertaremos de fato o povo da periferia. Esse novo sistema que nascerá através de uma revolução Socialista, deverá ser um sistema onde prevaleça a justiça, a igualdade e a solidariedade. Os meios de produção deverão ser coletivizados e se extinguirá a máxima do explorado e do explorador. Os valores individualistas serão substituídos pelos coletivos, a educação de qualidade e a saúde serão universalizadas e todos terão acesso pleno, a ciência e a tecnologia avançarão a serviço do povo. Iremos respirar mais democracia com todo o povo participando das decisões políticas, o Estado que no Capitalismo está a serviço das elites e de seus interesses mesquinhos, estará a serviço dos interesses populares, para que em uma fase mais avançada ainda, ele seja extinto e com isso seja extinta de uma vez a sociedade de classes.
“Se tu lutas, tu conquistas, tipo assim” (SNJ)
Falando assim até parece fácil, mas essa sociedade não nascerá através de um toque de mágica ou através de um resultado eleitoral. Ela é conseqüência de muita luta e só será alcançada se a consciência do povo avançar. O atual estágio de nossa luta é o da resistência ao capitalismo, lutamos por emprego, por moradia, por educação e saúde de qualidade e acessível para todos. Lutamos por saneamento básico, por acesso a cultura e ao lazer. Lutamos pelos direitos que nos são negados, lutamos contra o racismo que é também conseqüência desse sistema, lutamos contra o machismo e pela emancipação das mulheres, lutamos por produção cultural independente e com as raízes brasileiras, lutamos por uma mídia imparcial que não seja um panfleto da burguesia. Lutamos acima de tudo para ganhar consciências, ganhar corações e mentes para nossa luta, lutamos pela união das quebradas contra a fragmentação do cada um por si que o sistema prega. Lutamos para que o Movimento Hip-Hop enxergue seu caráter de classe e seu potencial revolucionário, para que nos juntemos aos revolucionários do Brasil que ao longo de nossa história derramaram seu sangue na resistência contra o sistema e que continuam lutando por uma nova sociedade.

“Revolucionários do Brasil, fogo no pavil, fogo no pavil” (GOG).

André Gomes é da direção nacional e da direção municipal de Marilía/SP do Nação Hip-Hop Brasil.

Fonte: www.nacaohiphopbrasil.com.br

UMA ENTREVISTA

Salve amigos e amigas, nessa edição especial do fanzine do mês da Consciência Negra trazemos uma entrevista com Erivelto Martins da Silva. Ele que nasceu em Serra Talhada, Pernambuco, no ano de 1955 veio com os pais para o Paraná ainda criança. Violeiro, amante do Cordel, nos concedeu essa entrevista numa tarde de sábado de muito sol em sua humilde casa na Vila C. A seguir, a entrevista com esse irmão que já passou várias dificuldades na vida, mas sempre diz que a pior pobreza é a falta de cultura.



Z - Vamos começar pela sua infância.

Erivelto - Foi uma infância muito árdua, viu. Serra Talhada é uma cidade cravada num sertão de muita seca, ás vezes dois anos, três anos sem chuva. O meu pai, depois de uma longa luta, batalhando pra arrumar comida chegou a conclusão que não tinha jeito. Mas também não tinha como ele fugir da seca. E por coincidência as duas coisas que ele tinha era uma espingarda de carregar pela boca, uma rede, minha mãe e eu. Porque nem mesmo rapadura, farinha que era a base de alimentação do nordestino já não existia mais. E é interessante que meu pai com essa espingarda saiu pra tentar caçar naquele cerrado pra caçar um calango, um lagarto, alguma coisa pra poder se alimentar e matou um gato. Só depois que ele foi ver que era um gato do mato. Na hora que ele tava tirando o coro passou um cara e falou: “rapaz não perde esse coro que esse coro é valioso”. Meu pai levou esse coro pra cidade e vendeu. Esse mesmo dia na cidade tinha um cara com um caminhão ajuntando gente pra vim embora pro Paraná. Meu pai não pensou duas vezes, voltou pra casa, avisou pra minha mãe: “pega o menino, pega o que tem”, porque tinha poucas coisas, panelinha de barro, jogamos encima do caminhão e assim foi 18 dias de viagem de Serra Talhada à uma cidade chamada Jandaia do Sul no Paraná. Esse foi o primeiro sofrimento porque as “Araras” que era chamado os nordestino que vinha de caminhão, a polícia rodoviária já tinha uma lei proibindo esse transporte, então eles lonavam o caminhão e as araras vinham tudo fechada. Então imagina só, aquilo o cara não tomava banho, 18 dias. Nós chegamos aqui e fomos trabalhar nas grandes lavouras de café, mas uma coisa eu te digo, não posso reclamar da minha infância; foi uma infância que realmente deixou muita saudade. O Paraná tinha muita fruta, muita água, muito lambari pra pescar, muita água pra gente tomar banho, passarinho pra caçar de estilingue, comia a fruta que queria. Roupa, calçado era uma coisa pouca, quase não se tinha, mas desse dia pra cá não se passava mais fome, foi uma infância muito boa. A infância ela tem que ser baseada num grande círculo de amizade, de integração, e a gente aprendeu muito cedo que uma coisa que tem que fazer parte da vida é a tal da cultura. Então desde pequeno, assim que pôde, o meu pai já conseguiu arrumar um rádio pra ouvir as músicas, meu pai já conseguiu aqui no Paraná a comprar sua sanfoninha pra tocar pra família pra nós ouvir. E outra coisa que eu ressalto da minha infância e das minhas dificuldades é que nós nunca pediu. Eu sempre falo que uma das coisas muito bem feita que compôs Humberto Teixeira e o grande Luiz Gonzaga é uma parte de uma música que se chama Vozes da Seca que fala: “eu dou uma esmola pra um homem que é são / ou lhe mata de vergonha ou vicia o cidadão”, porque deve ser a maior vergonha de um homem privilegiado com dois braços, duas pernas, duas vistas boas, andando, falando bem, ter que pedir. Dificuldade ouve, mas foi uma infância boa, eu tenho saudade dela.

Z - Essas músicas de viola dessa época, cantadas pelo pessoal do campo, trazia a problemática da cor da pele nas letras ou abordavam outros termas?

Erivelton - Olha, o preconceito racial sempre existiu. E naquela época as grandes fazendas de café no norte do Paraná, a maioria dos que moravam na época era descendente de italianos. Eu não sei se nós tivemos sorte ou se foi o nosso jeito de se sobressair, de conviver com esse povo, eu não sei se eu digo felizmente ou infelizmente, nós não tivemos essa coisa desse preconceito; nós entramos e saímos muito bem. Agora a música, a cultura musical, meu pai já tinha porque ele cantava Luiz Gonzaga. Luiz Gonzaga foi um artista que na minha visão é um artista completo. “Completo porque?”. O compositor, o artista ele deve amar o seu lugar e cantar sua terra, cantar sua pátria, né, cantar sua cultura. Luiz Gonzaga cantou todos os matos que tinha no Nordeste, cantou as rezadeiras, as benzedeiras, os macumbeiros, os jumentos, os cabritos, o sofrimento do nordestino, a alegria pela chuva quando vinha, as festas folclóricas do sertão... Então ele coroou, ele cantou tudo, e ensinou isso pro mais pobre ao mais abastado que o pobre tem que ter cultura. Quando nós viemos aqui pro norte do Paraná nós começamos a ver uma outra cultura que era na época a Moda de Viola. Assim como o gaúcho canta as suas cochilhas, assim como o pessoal do rap hoje canta essa cultura de quem vive nas periferias mais pobres, assim na época o caipira cantava o trabalho árduo de derrubar o mato, de plantar a lavoura, de colher, a composição dele cantava isso, né, cantava sobre o animal que era valorizado, não tinha tantos carros igual hoje; então ele cantava a pujança da sua mula, de seu burro. O poeta se inspirava naquilo. Ele cantava o carreador que puxava o café, cantava a bravura. Leo Canhoto na época cantou várias músicas que enaltecia o lavrador, chamava: “Soldado sem Farda”. O Pedro Bento tem uma música, uma moda de viola que fala assim: “só depois do meu tropeço eu fiquei sabendo o preço do feijão que a gente come”. Ele dizia da luta dura do cara que veio da cidade pra roça, com destino de melhorar na roça, largar o ar contaminado da cidade grande. Ele dizia: “Eu fui criado na cidade, estudei numa faculdade e cheguei a ser doutor / me casei com a Cristina uma jóia de menina, mais bonita que a flor / como era o nosso intento, logo após o casamento deixamos a capital / pensando em nosso futuro, procuramos o ar puro ali da zona rural (...) Faz um ano mais ou menos, que moramos nesse ermo, como to arrependido / carrapato e outros bichos, mosquito e outros bichos deixa a gente aborrecido / na noite que não tem lua o meu drama continua até o outro dia cedo / só na luz da lamparina, coitadinha da Cristina chega até chorar de medo / na cidade eu divertia, o trabalho que eu fazia pra mim era brincadeira / mas no cabo da enxada, sinto a barra mais pesada, quase morro de cancêra”. Entendeu então, ele não tinha outra saída a cantar isso. Aí eu aprendi a gostar dessa poesia, não que eu não goste das outras culturas, eu adoro as outras, mas o homem que tem a sensibilidade de fazer a poética de seu vivenciamento, esse homem tem que ficar no marco histórico do seu país, não pode ser esquecido. Puxa vida!!! Essas são a identidade do caboclo. Ou nós pra chegar no computador, será que nós pra chegar nessa vida moderna, nós não passou por isso? Eu sei que essa cultura não vai me levar a dinheiro, mas o dinheiro maior é a riqueza de preservar ela. Foi na época, então era essa a época caipira.

Z - Aqui no Paraná você já sofreu preconceito por causa da cor da pele?

Erivelto - É igual eu falei, eu não posso contar que eu sofri, se eu falar eu vou ta mentindo. Mas eu vi muita gente e presenciei e muitas das vezes eu fiz a defesa de amigos. Eu até penso o seguinte, tem gente que fala “mas eu não sou negro, eu sou moreninho”, pra mim isso já é um preconceito. Eu sempre brinquei com o pessoal dizendo que se passar um minuto do meio dia já não é mais bom dia, é boa tarde e se passar um minuto das seis, já não é mais boa tarde é boa noite. Então assim, se você teve essa cor cabocla, essa cor de cuia, você é da raça negra. Eu presenciei muitas armadilhas “Armadilhas!!!”, coisas que : “não, mas o cara é um preto da alma branca”, eu nunca aceitei isso. Se o cara dizia pra mim você é um preto da alma branca eu falava não, eu sou um preto da alma preta e tenho orgulho de ser negro. Se isso pra você é um problema, eu não devo satisfação nenhuma a você e não vou me rebaixar dizendo que eu sou um preto da alma branca. Que alma branca? Vi muita gente passar por isso e agente implantou muitas lutas. Saí na defesa da pessoa porque o que dói no vizinho dói na gente também. Agora eu graças a Deus, não sei se por sorte, ninguém tirou muita farinha comigo até porque sabia que ia ter uma resposta meio pesada.

Z - O Movimento Hip-Hop chegou no Brasil também como um resgate do orgulho da raça negra. A pessoa se afirmar: “Sou negro, sou favelado, mas não sou menos que ninguém por isso”. Como você vê a importância de movimentos como esse?

Erivelto - Olha, eu busquei um espaço, como todo mundo sabe, dentro da política de Foz. Busquei um espaço, fui conquistar um espaço. Eu sempre, mesmo na roça, sempre gostei muito de ver jornal, A Voz do Brasil, Projeto Minerva, e quando eu não podia comprar um jornal eu pegava um pedaço de jornal da rua que alguém já tinha lido. Quando eu conquistei esse espaço, dentro da Fundação Cultural, por exemplo, eu via os irmãos do Rap não ter um tratamento que eu achei que merecia. Porque? Porque, assim como na época do caipira nós cantava aquela cultura, os irmãos do Rap hoje cantam aquilo que ele ta vivenciando no dia a dia da sua comunidade. A oportunidade que ainda não chegou na periferia, a situação em que ele vive, e muitas das vezes convivendo até com o crime mesmo. Ora!!! Se ele ta vivenciando isso o que ele tem que fazer a cultura dele cantar? Ele tem que cantar o que ele vivencia, a dificuldade, a falta de oportunidade, o crime, a droga, porque ele vive ali dentro. Agora as cabeças, muito das vezes mais pensantes, começou a discriminar essa gente. Eu fui associando o Hip-Hop, o Rap, com o Cordel. Eu fui associando, o que aqueles poeta nordestino falavam, eu vi que a linguagem apesar da diferença ela tava inserida no mesmo contexto, e isso me doeu bastante. Me doeu tanto que quando me deram a chancezinha de ter um pouco de voz, de usar a instituição maior da cultura eu fiz questão de levar o Hip-Hop ao patamar um pouquinho melhor, sei que foi pouco ainda, o que eu fiz foi o que eu pude fazer. Mas foi o que eu pude, então pra mim foi bastante. Se eu pudesse fazer muito mais eu estaria hoje pensando: “puxa, mas eu fiz pouco, eu fui omisso”. Não, eu só podia fazer aquele pouquinho, mas o pouco que eu pude fazer eu fiz. O meu sonho dentro disso aí é o seguinte, dotar essa cultura de instrumentalização, de instrumentos, para viabilizar para que o povo escute. Mas para que o povo possa escutar, não adianta escutar só como uma música qualquer, o rap não é só uma música, o rap é narrativa de fatos e narrativa de fatos você tem que aprender a interpretar. O dia que esse povo começar a interpretar isso com certeza estaremos dando uma grande colaboração pro crescimento da sociedade. É uma bela de uma cultura.

Z - Um tema que ainda é polêmica: Cotas para negros.

Erivelto - Pois é, eu fiz parte do movimento negro da cidade de Foz do Iguaçu (MONARFI) e levei muito pau por falar o que eu penso. Mas assim como toda democracia que não tem oposição, é democracia burra, então qualquer instituição que você estiver você tem que respeitar o pensamento do seu oponente e nunca omitir o seu pensamento. Ora, e porque eu levei muito pau? Porque eu sou totalmente contra qualquer espécie de cota que se dê por causa da cor da pele. Eu sou contra mesmo. Aí que ta o seguinte, isso é uma política de tapeação. Pra ganhar a simpatia do pessoal de cor, da nossa raça que é a raça negra, eu declarei isso em televisão, em vários canais, é uma tapeação pra conquista política. Olha, qual é a diferença hoje por exemplo, do aluno periférico, que estuda na periferia, do branco e do negro? O sofrimento do negro ta sendo maior do que o do branco da periferia? Não é. A escola pública que o negro estuda e a do branco pobre de periferia é diferente? Não é. Então a cota, ela tem que ser mudada. A cota tem que ser direcionada pro aluno que vem da escola pública. O vestibular tem que ser o mesmo. Ele quer testar com isso o que? Que a inteligência do negro é menor do que a do branco, por isso merece um vestibular mais fraco? Olha, mas não tem isso escrito nem na bíblia. Acredite ou não acredite, Nelson Mandela falou que já tinha lido todos os livros da história da humanidade e não encontrou nenhuma linha falando que a inteligência do negro fosse inferior que a inteligência do branco. Se a inteligência, o QI, Deus deu essa sabedoria, Deus não é irracional, não vai dar pra um ser humano mais inteligência que pra outro. Cada um tem sua vocação. Se o negro não teve vocação pra seguir a carreira de engenharia, mas teve pro esporte, teve pra outra cultura, pra desenvolver outra coisa. Não que eu to dizendo que não tenha capacidade pra desenvolver engenharia, medicina e tudo isso. Cuba é uma grande prova disso, uma das grandes escolas de medicina avançada é em Cuba. E porque se lá quase todo o pessoal é negro? Isso aí ta errado, nós vamos ter que fazer uma luta o seguinte: nós que fomos por muitos anos discriminados, agora não vamos discriminar o nosso periférico branco. Precisa rever isso, nós não podemos aceitar esse preconceito nem de religião, nem com nossos irmãos gays, nem com nossos irmãos judeus e nem com nossos irmãos brancos. Quer dizer que vamos inverter esse papel agora? Não. A cota tem que existir. Porque quem estuda em escola particular pode pagar cursinho, depois vem tomar as vagas do negro e do branco nas faculdades públicas. Isso eu não concordo. Agora, dizer que negro precisa de cota, não precisa. Me dá oportunidade de fazer advocacia ali, sem eu pagar, que eu vou provar que vou ser um advogado tão bom quanto o branco. É só dar uma chance pro cara.

Z - Polícia e Capitão do Mato, Navio Negreiro e Camburão, tem alguma semelhança?

Erivelto - Pra mim não tem diferença nenhuma. A única diferença que posso achar é que a gente não pode generalizar a polícia. A polícia tem seu papel e ela que cumpra bem. O problema é a cabeça de muitos que ta na polícia. Então porque eu sou uma pessoa diferente, ou por ser as vezes negro, a polícia já chega dando dura porque acha que todo mundo é ladrão, e não é assim. Mas isso ta mudando, até porque os maior ladrão e os maior larápio não se transveste de mal vestido, de barbudo e de negro. Né? Os maior ladrão, os maior assaltante pra assaltar banco eles chegam sempre engravatadinho, pastinha 007, coisa de rico. (risos). Jóia no pulso, anel nos dedos. Até porque se fosse assim era fácil de combater, o cara via chegar no banco aquele cara meio sujo e maltrapilho já dizia: é o ladrão. Mas não é, não existe mais este pensamento. Agora, eu vi cenas, infelizmente até aqui na cidade que ainda foi lamentável, generalizar: “essa aí é a turma da maconha, é a turma do crack, é a turma da droga”. Ora, a polícia tem que ta preparada e inteligente pra saber quem ta usando a droga, quem é que ta passando a droga, porque esse é o pior de todos, pra ela ir direto na ferida, direto no cara certo. Ela não pode só porque o cara ta lá com a calça larga generalizar. Agora tem uma coisa que eu vou dizer e aí o negro precisa melhorar, o branco da favela, da periferia precisa melhorar, esse negócio de dizer que é coitado. “Eu sou um coitado, eu não vou procurar”, não, ele tem que buscar. Tem que buscar seus direitos, tem que estudar, buscar escola, tem que ir pra cima, pra tirar essa máscara que se põe de que você é um coitado. “eu não sou um coitado, eu sou um servente de pedreiro e daí, eu sou um catador de reciclável, passo com minha carroça, mas eu sou cidadão e devo ser respeitado como um cidadão, não sou coitado não”. Tem que lutar desesperadamente pra busca de conhecimento, porque se não, ele vai ta sempre fadado ao fracasso.

Z - A Cultura Negra continua fiel às raízes africanas?

Erivelto - Eu acho que a cultura negra, ela decaiu bastante. Ela ainda é forte, ta bastante forte em várias regiões, ela ta bem regionalizada, até porque onde nós vivemos aqui a colonização se deu mais pela força européia, né. Mas, por exemplo no Maranhão, eu tive pesquisando esses últimos tempo, a cultura é muito boa, né, muito rica. Passaram a terra aos quilombolas como é de direito deles. O Maracatu em Pernambuco. a tradição da capoeira, as tradições do negro. A Bahia. O Rio de Janeiro ainda com suas comidas típicas, feijoada, as caipirinhas, isso tudo aí faz parte de cultura. A cultura, as vezes a gente pensa só na música, mas ela ainda é forte. Quem que não gosta de uma boa feijoada? Agora, quem come a feijoada deveria ta consciente que isso ali faz parte de uma cultura negra. Entendeu? Eu penso o seguinte, o desenvolvimento que vem galopante nesse país, não pode abafar, que essas coisas são da cultura negra; nós não podemos deixar passar despercebido. Acho que os apresentadores, as pessoas da mídia tem que dizer: “olha, isso aqui é cultura negra”. Mas a cultura negra se mantém razoável. Até porque essa miscigenação, vai se dando, né. Nós não podemos fazer um apartheid: “eu sou negro, só caso com negra, você é branco, só casa com branca”, não pode haver isso aí, a coisa ta mudando”. Muita gente acha, eu já vi artista famoso que diz que os negros só procuram loira pra casar, mas eu não concordo muito com essas coisas. Eu acho que se procura quem tá na frente, quem encontrou, quem deu certo, independente da cor que é. Eu tenho um amigo que é negão casado com japonesa. Ué, e daí? Ele não podia ter casado com ela e ta feliz pro resto da vida? Vive bem. “Ah, eu não quis minha felicidade, só porque eu era negro e ela japonesa”, eu acho que não. Não é assim, coração é terra que ninguém anda. Se você é negro e achou uma negra pra viver, ótimo, mas se achou uma pessoa branca, e daí?

Z - Agora, as religiões de raiz africana ainda sofre um grande preconceito, né?

Erivelto - Ah, essa sofre. Até pela própria cultura, né. Porque é o seguinte, os negros tiveram de deixar suas religiões ocultas e até usar várias formas pra poder cultuar isso escondido. E se criou um mito aí que o negro é macumbeiro, que mexe com o diabo, com coisa ruim, se criou esse mito. E isso é uma coisa interessante, a própria religião católica fez uma barreira muito grande, os negros tiveram que mudar o nome do santo deles, sofreram esse tipo de coisa, e isso, infelizmente esse preconceito existe. Existe e é forte, né, hoje quando ainda se fala em candomblé muita gente: “nossa senhora!!!”. E depois que a gente vai lendo essa coisa toda, não é isso. Ô meu Deus do céu. Eu já acho um erro enorme os jesuítas chegarem aqui e querer batizar os índios e fazer os índios ter uma religião. Ora, deixa o índio lá na cultura dele, se aquele povo que vivia lá, nus, mas se respeitando, cultuando a sua família com respeito, criando as suas crianças dentro da educação, se aquele pessoal não tem direito à salvação não vai ser o padre indo lá pra catequizar o cara, pra batizar e fazer não sei o que, que vai conseguir. Eu não acredito nisso, acredito em Deus, o Deus dos negros, dos índios, do chinês, acredito que é o mesmo. Agora, forçar a cultura do cara, quebrar aquilo que o cara tinha de cultura pra dizer que o cara tava no caminho da perdição, infelizmente discordo totalmente disso. Discordo disso, isso foi tapeação, isso foi pra ganhar dinheiro. Isso aí não adianta mentir, eu sou uma pessoa muito séria nas minhas coisas, o que aconteceu foi isso. E se criou esse mito desgraçado e até hoje, infelizmente existe essas barreiras. Eu começo a ler a história do descobrimento do Brasil, e “encontraram os índios saudáveis, bonitos, cultuando seu deus tupã” foram lá tirar isso da cabeça do cara, pra ensinar até um monte de maldade (risos). Os caras não matavam, não roubavam, os caras não prostituíam, porque tinha que mexer com essa gente? Agora tem os missionários, vai lá na África profetizar. Vai cuidar da família dele!!! eu não acredito nisso. Não sei se to errado também, né, não sou dono da verdade.

Z - Vamos finalizar com uma idéia pros irmãos.

Erivelto - É, eu fico feliz da vida, né, e sei das dificuldades que vocês têm pra manter essa cultura e também da discriminação que existe. Mas é assim mesmo, você tem que fazer a sua parte, você não vai conseguir mudar, conscientizar o mundo. O que você tem que ta questionando é: “será que eu to fazendo a minha parte?”. E eu espero então aí poder participar muito mais, né. Fui bem tratado todas as vezes que participei. Fui conhecer, porque pra falar bem ou falar mal tem que primeiro conhecer. Eu só acredito que será possível se pessoas que tem essa filosofia de lutar por essa causa não desistirem. Que quando ele desistir ter sempre outro pra segurar a bandeira. Foi o sonho de grandes poetas, cantadores, um deles era o Raúl Seixas. O sonho dele era acabar com a ditadura militar, quando muitos calavam a boca, tinha quem preferia ficar encima do muro e não opinar, ele foi buscar uma linguagem própria de dizer: “eu prefiro ser essa metamorfose ambulante / do que ter aquela velha opinião formada sobre tudo”. Só uma palavra dessa, cara... é uma pena que hoje muita gente canta isso e não sabe o que ele quis dizer. “eu devia tá muito contente por ter um bom emprego, ter um carro, ser um dito cidadão responsável, ganhar dinheiro, mas eu me sinto é decepcionado / porque tem uma porção de coisas para conseguir e agora eu me pergunto e daí? / nós temos uma porção de coisas pra conquistar e não pode ficar parado”. Embora com suas dificuldades, com a desigualdade violenta, a pobreza abandonada do lado, o rico cada vez mais rico, o governo dando cesta básica pra ter popularidade, porque isso também é um erro viu. Nós não precisamos de cesta básica, não vou mentir não, eu sou eleitor e fã do Lula, até porque, quem sabe essa tendência que o mundo ta tendo na área política já seja uma mudança. Nós já temos um índio presidente de um país, já temos uma mulher, nós já temos um torneiro mecânico presidente de um país, e não ta passando vergonha não, se ele não pôde fazer tudo os que ficaram pra trás fizeram muito pior. E me parece que pra coroar essa história e pra fechar com chave de ouro eu acho que vai ser um dos pico máximo da história do mundo, um negro na maior potencia que é nos Estados Unidos. Olha, eu to torcendo tanto quanto se a eleição fosse no Brasil. Agora não adianta só torcer também, depois nós vamos ter que rezar e torcer pra que ele faça realmente uma revolução pra dizer pra todo mundo: “vocês viram que não era a cor que fazia dos Estados Unidos uma potência maior ou menor”. Então essa desigualdade que ainda tem, e ainda a cultura, que eu acho que a maior pobreza é a cultura do nosso povo, que ainda vota e ainda idolatra o cara que vem dar o tapa nas costas, bate palmas pra ele porque ele deu uma cesta básica. Essa é a maior dor em mim. Com meus 53 anos, já quase me aposentando, talvez eu vou partir ainda com essa dor. Porque o cidadão na hora que o político chegar pra dar a cesta básica, pra dar o tapa nas costas ele falar: “amigo, muito obrigado, mas no senhor eu não voto, sabe porque? Porque eu to precisando é trabalhar. Eu to precisando derramar o meu suor pra quando chegar em casa eu ter orgulho do que os meus filhos comer seja do meu trabalho. Eu to precisando é da escola pro meu filho pra ele disputar com direito de igualdade com os filhos dos ricos”. Essa é a obrigação dos políticos. São dois lados da moeda, o malandro que passa dando a cesta básica pra ganhar e o coitado que aceita e não sabe cobrar seus direitos, que é o direito ao trabalho, à vida, à moradia decente. É um direito do cidadão. Político não tem nada que bater palmas pra ele. O cidadão por mais miserável que seja ele paga seus impostos pra isso. Então não podemos bater palmas quando o cara vim com uma cestinha básica ou um tapinha nas costas. Isso aí um dia, se Deus quiser, acaba. Aí essa ditadura que o Raúl Seixas lutou pra acabar, eu tenho certeza que se ele estivesse vivo hoje ele estaria cantando essa outra ditadura que talvez seja até pior. E que nossa cultura tem que cantar. E que o Rap faz muito bem. Os nossos caipiras, nossos sertanejos, nossos artistas deviam cantar isso, cantar essa mudança. Canta isso, põe na letra. Põe na letra: “você é safado. Você ta dando remédio na hora da dor, quando você deveria ter dado oportunidade antes do cara sequer ter a dor”. As letras tem que falar isso. O Rap é um que ta brigando por isso. Nem sequer a nossa Bossa Nova que fazia crítica à ditadura ta fazendo isso. Isso é uma ditadura, é uma escravatura. Quem compra voto da periferia dando cesta básica e remédio e deixa de dar o emprego, de fazer o desenvolvimento do país. Isso não é uma ditadura? Ela mudou. São três tipos de escravatura, a que escravizou o negro, a que escravizou o imigrante e a que escraviza hoje brancos, negros e imigrantes das periferias. O pessoal muitas vezes me perguntam porque eu não saio candidato. Porque eu vou perder. Vou perder mil eleições. Porque eu vou soltar meu panfleto dizendo: “se é pela minha luta, por esse ideal aqui, vote em mim. Se for pra vim pegar as coisas na minha casa, cesta básica, remédio, não vote porque não vai ter”. Aí o pessoal da periferia não vai votar em mim. Então muito obrigado, agradeço mesmo, tomara que vocês continuem na luta. E contem comigo, o que eu puder fazer.

NAS, NIGGER E A METAMORFOSE DE KAFKA


O rapper Nas resolveu dar uma chacoalhada na água do Rap norte-americano. Nos últimos anos a galera do hip-hop gringo desencadeou uma grande campanha contra o uso de estereótipos e palavras pejorativas usadas contra negros, mulheres e homossexuais. Algumas gravadoras já não aceitam artistas que trazem em suas letras termos pejorativos. Esse ano, Nas resolveu colocar mais lenha na fogueira e anunciou que o título de seu álbum seria “NIGGER”. O termo Nigger é uma forma pejorativa de se dirigir aos negros. A polêmica se instalou e a discussão correu o país todo: “enquanto a população negra continuar a usar o “N” não podemos ficar irritados quando alguém usá-lo”; “somos a única raça na terra que usa esse xingamento como uma “forma de carinho” um com os outros”.
Após grande pressão da indústria fonográfica norte-americana, Nas retira o Nigger e lança seu álbum sem título. O álbum vem com um forte conteúdo político e um grande discurso em torno da questão racial. Nas afirmou que mesmo o álbum saindo sem título os ouvintes saberão seu verdadeiro nome. E numa jogada de mestre ele lançou uma mixtape (de forma independente) junto com o Dj Lantern. A mixtape recebeu o nome de Nigger Tape e mostra na parte de trás do álbum o rapper com a costa flagelada e uma grande cicatriz em forma de letra N; uma referencia à problemática racial e como os escravos foram torturados.
No livro A Metamorfose, Franz Kafka conta a história de Gregor Samsa, um jovem que transforma-se em uma barata. O rapper Nas atacou de Kafka e gravou no disco Nigger a música Project Roach: “Uma barata é o que eu sou, otário / o gueto é o meu território, otário...”. Ele faz uma comparação do tratamento dado aos insetos - considerados nojentos e desprezíveis - com o tratamento dado aos negros.
Em entrevista à MTV Nas afirmou: “Olhei para a miséria, para as ruas, para os guetos e favelas, nós não somos vistos como algo belo ali. Nós somos vistos como a pior peste, e por causa disso, por causa desse tratamento, alguns de nós acabam acreditando que são uma peste e começam a agir como tal.”

(Lizal, Foz do Iguaçu)




DANÇAS SOCIAIS (Por Pedro Almeida)

Caros amigos da cultura Hip-Hop local, promovemos mais uma vez o estudo do Street Dance neste mês falando sobre Danças Sociais.
É certo afirmar que chamamos de Street Dance, várias danças cuja algumas semelhanças lhes permitem ser agrupadas, semelhante ao caso das danças de salão e das danças folclóricas. Uma das características dessas danças está no processo de criação, aliás todas elas foram criadas a partir de pequenas leituras de movimentos que seguiam a mesma tendência, criadas a partir de passinhos no mesmo estilo em outras palavras.
Assim todas as danças dentro do Street Dance, o Lockyng, o Popyng, o Breakyng, o House, o Hip Hop Dance e todas as outras danças não só possuem suas Danças Sociais como foram criadas a partir delas.
Como parâmetro de pesquisa:
No lockyng existe: Point, Skitter Habbit, Stop and Go ...
No Hip Hop Dance: Monasterie, Bismarck, Hill and Toe...
Importante é saber que há danças sociais tão estudadas que se confundem com vertentes do Street Dance como o C walk e o Boogaloo. É importante frisar também que, existe a liberdade coreográfica que permite a cada estudante executar as danças sociais de determinada vertente na sua coreografia mesmo sendo de outro estilo, quer dizer, não tem problema nenhum eu fazer um top rock em uma coreografia de house desde que coreograficamente tenha sentido. Esta liberdade ajuda a confundir o estudo dificultando saber qual a proveniência de cada passo, uma vez que podemos ver o Farm , no Lockyn no Hip-Hop dance e Break, mas é um passo do house.
Enfim chamamos de danças sociais os 'passinhos' existentes em cada modalidade.

(Pedro Almeida é estudante de Danças em Foz do Iguaçu).

Assita ao vídeo Skeeter Rabbit : locking tutorial.

“ELES NÃO SÃO MONSTROS” (Por: Eliandro Avancini)

Essa foi a frase da mãe de dois meninos de 15 e 16 anos, acusados de terem participado de um assalto na cidade. O fato, acontecido com um Bombeiro que teve seus filhos expostos a toda crueldade possível, é repugnante por si só, crueldade essa que penso não advir de garotos drogados, mas sim, de uma sociedade decadente, falida cuja moral e os princípios são corrompidos em seu próprio seio. O caso televisionado e com uma grande repercussão local, principalmente em um programa policial. O interessante neste caso é como as pessoas que formam opinião nessa cidade trataram o tema, de um lado o Delegado da Polícia Civil sendo entrevistado ao vivo, de outro o apresentador, duas opiniões divergentes. O apresentador rogando pragas ao ECA, Estatuto da Criança e Adolescente, de outro o Delegado, homem de seriedade por sinal, comedido e apaziguando as pragas ali expostas. O que ficou evidenciado é como a falta de informação, ou melhor, a informação desqualificada e imprópria possa induzir as pessoas ao erro, pois o ECA é uma lei que não protege marginais, como afirma alguns, ela protege sim, menores jogados a sorte, milhares de crianças que são expostas diariamente a todos os tipos de crimes, como exploração sexual, violência de todos os tipos, exploração de trabalho infantil etc. Nesses casos ninguém lembra do ECA, infelizmente. Compactuar com a opinião de que o ECA é uma lei que protege marginais, é compactuar com o retrocesso de políticas que visam pelo menos, diminuir, e não acabar infelizmente, com a violência a qual são expostas nossas crianças diariamente, mas isso é um avanço para nossa sociedade, que vê desmoronar em cada jovem que perdemos ao crime seu sonho de justiça e qualidade de vida. O que mais entristece é saber e ter certeza que casos como o desses adolescentes serão recorrentes em nossa cidade e nosso país. Ainda veremos cenas de mães acuadas e impotentes perante repórteres, e principalmente perante uma sociedade que condena suas vítimas sem julgamento. É triste saber que isso vai acontecer enquanto o sistema perverso de acumulação de capital, que prima o lucro ao ser humano ainda vigorar. É evidente que os atos cometidos pelos adolescentes são repugnáveis e passível de condenação justa e qualificada. Mas esses meninos não são monstros, monstros são aqueles que tiraram suas perspectivas de outro tipo de vida, monstros são aqueles que permitem o acesso de jovens as drogas e as armas, monstros são aqueles que roubaram seus sonhos, monstros são aqueles que transformaram esses jovens em monstros.

(Eliandro Avancini é professor e colaborador do MEGAFONE)

Fonte: www.megafone.inf.br

IDÉIA PRA PERIFERIA

Idéia do Bairro: (Por Mano Edo)

IV - Mudança de vida por uns dias.

Depois que acontecera o homicídio do menino Clemente, Gugu resolveu mudar de vida, ficou sabendo de um projeto que há logo depois da favela e tentou partilhar fazendo sua matrícula para o segundo semestre do ano de 2004. No entanto, a Páscoa acabara de passar, e Gugu achou bastante tempo até lá para esperar. Enquanto não passava este tempo esperado Gugu e Gustavo foram coletar recicláveis também, conseguiram um pequeno carrinho e saiam pelas ruas das periferias e da parte central a procura de algo. Uma surpresa acontecera no centro, o mesmo policial que chegou por primeiro na hora que mataram o menino Clemente na favela, estava no centro dando continuidade a operação. Gustavo fixou os olhos no policial e disse que seria melhor saírem dali antes que o policial o conhecesse do momento da morte de Clemente.

- Vamos embora que estou com medo de que o policial conheça “nóis”.

- Positivo! Vamos sair antes que ele mande nós; Com receio saem e vão para outro lado do centro.

Como a coleta foi frustrante de não conseguir nada resolveram voltar para a Morenitas, e na Morenitas chega o menino de cavalo que cata recicláveis com uma charrete, Gugu viu e ficou com inveja do menino e pensou em fazer malandragem. Por que Daniel fazia seus trocados todos os dias; chovendo ou não Daniel faz a coleta. Gugu invejoso como todo os que invejam, que não pode ver qualquer coisa, já queria conseguir uma charrete e um cavalo. Assim não precisaria fazer força puxando todo o conteúdo que achariam no meio da rua. E por conseqüência de um ato de ganância e inveja Gugu levou uma surra de um grupo de marginais criminosos que queriam possuir seu boné (não sei o que acharam num boné sujo quanto os recicláveis coletados) e ele quis recusar se esquivando e respondendo com atitude de trombadinhas e se deu muito mal. O menino do cavalo conhecia muito bem um dos meninos do grupo e pediu que seu primo - que até no momento era que comandava aquele bando - devolvesse o boné a Gugu. Pois, José disse que Gugu era, e sempre foi, um vacilão e teria que virar homem ou virar mulher de uma vez. Que ali tinha pra casear a hora que ele queria. Gugu saiu assustado e notou que por sua ganância sempre se dá mal e é excluído em maioria das vezes nas outras comunidades de periferia. Apenas Gustavo é o que suporta quando está bom ainda. Então a operação acabou e Gugu e Gustavo acaba de ganhar um filhote de cavalo de Daniel. Daniel sempre estava vendo os dois meninos pelas ruas do centro e resolveu doar sem saber que os dois por embalo de Gugu iriam fazer maldade (sempre a bondade ganha da malícia). E os dois iriam todos os dias coletar pelas ruas do centro. A doação de Daniel era ainda filhote; enquanto o filhote de cavalo estava desmamando, Daniel resolvera falar aos meninos para irem providenciando uma pequena charrete ou carroça de começo.

- Hein, Gustavo você entra em contato com o Gugu e diz a ele para vocês providenciarem uma charrete sei lá.

- Vamos ver, ele está chegando e eu conto a ele o que tu disse, agradeço desde já.

Em alguns minutos aparece Gugu e Gustavo fala a ele:

- O, Gugu o moleque Daniel esteve aqui e sugeriu que nós fossemos já arrumando um meio de transporte para usá-lo com o cavalo.

- Se liga, só porque ele deu o cavalo já quer mandar em nós. Continuaram discutindo sobre o meio de solução ou o meio de condução ao trabalho.

**********

Onde a Crew desenvolveu trabalhos:

No dia 13 de setembro a Crew Cartel do Break, comemorando 8 anos de banca CDR, fizeram uma apresentação no show do Thiagão e os Kamikazes do Gueto. No dia 15 de setembro se apresentou no teatro Plaza Foz casa de espetáculo. No dia 23 de setembro no lançamento do Livro Espada e a Luz do autor Jhonatan, que fora sediada no salão da Fundação Cultural. E no dia 28 de outubro na escola Airton Senna.

Inclassificáveis (Arnaldo Antunes)

Que preto, que branco, que índio o quê?
Que branco, que índio, que preto o quê?
Que índio, que preto, que branco o quê?
Que preto branco índio o quê?
Branco índio preto o quê?
Índio preto branco o quê?

Aqui somos mestiços mulatos
Cafuzos pardos mamelucos sararás
Crilouros guaranisseis e judárabes
Orientupis orientupis
Ameriquítalos luso nipo caboclos
Orientupis orientupis
Iberibárbaros indo ciganagôs

Somos o que somos
Inclassificáveis

Não tem um, tem dois,
Não tem dois, tem três,
Não tem lei, tem leis,
Não tem vez, tem vezes,
Não tem deus, tem deuses,

Não há sol a sós

Aqui somos mestiços mulatos
Cafuzos pardos tapuias tupinamboclos
Americarataís yorubárbaros.

Somos o que somos
Inclassificáveis

Que preto, que branco, que índio o quê?
Que branco, que índio, que preto o quê?
Que índio, que preto, que branco o quê?

Não tem um, tem dois,
Não tem dois, tem três,
Não tem lei, tem leis,
Não tem vez, tem vezes,
Não tem deus, tem deuses,
Não tem cor, tem cores,

Não há sol a sós

Egipciganos tupinamboclos
Yorubárbaros carataís
Caribocarijós orientapuias
Mamemulatos tropicaburés
Chibarrosados mesticigenados
Oxigenados debaixo do sol

Fonte: Revista Escrita n° 5






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NOVELA DA VIDA REAL

Mais um Cidadão José Cap. 32

José subiu até a esquina. No caminho olhou pra trás umas duas vezes. Queria acreditar que a Preta estava em casa. Imaginava ela correndo em sua direção gritando: “José, José!!!”. O neguinho vinha logo atrás correndo e sorrindo olhando para ele. Queria ter quatro braços para abraçar os dois e ficar assim por horas para matar um pouco da saudade. Mas, seus pensamentos fugiram quando, ali da esquina, viu uma viatura vindo a milhão em sua direção. Distraído, José não dispensou o canhão, continuou andando de encontro com a viatura. Ela vinha de farol alto que dificultava a visão das pessoas que andavam na rua. Virou a esquina e seguiu em alta velocidade. Desta vez deu uma olhadinha para José e as demais pessoas que caminhavam pela rua. Algumas quadras pra cima outra viatura enquadrava alguns malucos que estavam de moto. José estranhou a movimentação da polícia naquela noite, tudo indicava que aconteceu algo, um grande assalto ou o assassinato de alguma pessoa “importante”. Quando é um favelado que é morto, a polícia só aparece na hora e depois já arquiva o caso e deixa quéto. Os bares já estavam vazios, o que é raridade na periferia. Caminhou tranqüilo até perto da sua goma. Antes de chegar em casa passou num barzinho pra comprar um litro de vinho.

- Us bar ta tudo vazio hoje Seu Pedro, que que aconteceu?

- Mataram dois polícia e cortaram a orelha de um. Todo mundo que eles tão achando na rua tão enquadrando e levando preso como suspeito.

- Vich, que fita!!! Vou vazar pro meu barraco.

- Daqui a pouco já vou fechar, hoje ta cabuloso.

José triou pro seu barraco. Decidiu que só ia viajar no dia seguinte. A rodoviária devia ta um formigueiro de tanta polícia. Abriu a garrafa de vinho e pegou seu Mp4, que ele comprou de um maluquinho. Pagou 10 reais e o aparelho já veio carregadinho de música. No começo apanhou para aprender a mexer nas funções do menu, mas depois pegou o jeito. Tomou um gole de vinho e foi pra pasta de Rap Nacional. Apertou o play na música A Bússola, do grupo União Racial. O som é bem pra cima e José escuta direto: “O Rap nasceu pelo motivo / pra ser contra o preconceito e também contra o racismo (...) ô maloquêro, o maloquêro, maloquêro sô / quem te ensinou a rimar? / ô maloquêro sô / ou o sistema que te pariu / ô maloquêro sô / ou a vontade de mudar / ô maloquêro sô (...) Hip-Hop direciona a luta / pra quem ta perdido rap é a bússola / indica o sentido no caminho que eu sigo / sempre atrás do que me faz ter paz e equilíbrio”. José adormeceu com o fone no ouvido, nem escutava o barulho da sirene da polícia que insistia em entrar e sair da favela madrugada à fora.

Em uma quebrada perto dali, o Mano Pio estava em frente ao seu barraco num pequeno bequinho, fumando um baseado. Estava ali sozinho, olhando pro céu carregado de estrelas e a lua que insistia em brilhar, contrastando com a escuridão da favela. Estava ali solitário, pensativo, imaginando mil fita. O Pio já tem 30 anos de idade e 15 anos que mora sozinho e faz seus próprios corre pra sobreviver. Se emancipou porque não agüentava mais as brigas em casa. Sempre foi correria nos trampos. Trabalhava o dia inteiro de servente de pedreiro e chegava à noite em casa cansado, queria descansar, mas as brigas e discussões eram constantes. Seu pai bebia todas no bar e brigava diariamente com sua mãe. Quando começava os xingamentos, palavrões, coisas voando pela casa, quebrando, choro, gritos, ele saia de rolê e ia pro bar. Uma mão num barzinho ficou sabendo de uma quitinetizinha que tinha pra alugar ali perto da quebrada. Nunca mais voltou pra casa. Dali foi morar em outras casas alugadas até conseguir comprar seu próprio barraco em uma favela do outro lado da cidade. Foi ali que conheceu uns malucos e se envolveu com o crime.

Um maluco desceu correndo o beco e foi até onde estava o Mano Pio.

- Salve irmão. Se moca aí no barraco que ta chovendo viatura na favela.

- O que que aconteceu?

- Zeraram dois polícia.

- Vich!!! Chega aí tio.

Os dois entraram no barraco e o maluco disse que mataram o gambé Farias e cortaram a orelha dele.

- Deixaram os corpos no porta-malas da viatura, na entrada da quebrada, e um bilhete provocando os gambé.

- Você lembra quem tinha pego o envelope com os dados do Farias?

- Acho que foi o Zé.

- O José? É verdade.

Mano Pio pegou o celular e fez uma ligação.

- Salve Mano Gê.

- Fala Mano Pio.

- Cê não sabe o que aconteceu.

José acordou 8:00hs da manhã, escovou os dentes, lavou o rosto, colocou uma bombeta e saiu com sua mala de muambeiro. Pensou em chamar um tx, mas achou muito flagrante. Caminhou até o ponto de ônibus e ficou esperando. Começou a olhar sua quebrada e ficou triste. Estava saindo sem se despedir de ninguém e não sabia quando poderia retornar. O ônibus estava demorando e José começava a ficar nervoso, impaciente. Todo o carro que passava parecia que era de policiais disfarçados. Um carro estava virando a rua, voltou e foi até o ponto onde José estava. O rapaz da boléia estava de boné e óculos escuro, o carona também. Fez um sinal pra José entrar no carro. “ O Mano Gê quer falar com você”.

Pela voz, José percebeu que era o Mano Pio, o carona ele não conheceu. Entrou no carro e ficou ali no banco de trás com a sacola cheia de roupas do seu lado. O carro seguiu lentamente em direção a Ciudad Leste, Paraguai. Atravessaram a ponte tranquilamente e deixaram o carro no estacionamento de um shopping. O dia estava movimentado, milhares de compristas andavam pra lá e pra cá entrando e saindo dos shoppings. Funcionários abordavam as pessoas na rua entregando panfletos e tentando convencer os clientes de que sua loja tem os melhores preços. O capitalismo se mostra forte naquele lugar. Milhares de lojas com tudo o que você pode Imaginar. “Chegou Mp7”, gritava um vendedor. Numa pequena loja de DVD pirata um senhor comprava 10 DVDs por 10 reais. Os vendedores da rua disputavam os fregueses.
Ofereciam barbeadores, perfumes, meias, bonés, roupas. Um rapaz que vendia massageadores a pilha, ligou um e esfregou nas costas de uma mulher que tomou um tremendo susto. Quase que o vendedor apanha. Na frente de uma pequena lojinha tinha um rapaz fazendo propaganda com um microfone ligado em uma caixa amplificada. “Vamos chegar freguesia. Aqui é o Mercadão da Economia!!!”. Uma mulher viu o tamanho da lojinha e brincou com ele: “Mercadão? Uma lojinha dessa?”. O rapaz devolveu: “a loja é pequena porque o depósito é grande. E você já ouviu falar que os melhores presentes estão nas menores caixas?”. Ele se aproximou da mulher e falou algo em seu ouvido. A mulher sorriu e entrou com ele na loja. Os três malucos caminhavam entrando em bequinhos e pegando atalhos que o Mano Pio parecia conhecer muito bem. Vez ou outra os vendedores os abordavam: “Camisinha musical. Compra aí...”; “Batata frita. Barato, barato”. Um vendedor de perfumes ficou seguindo eles. “Perfume? Tenho o melhor preço”; “Lança-perfume?”; “e maconha vocês querem?”; “farinha? A mais pura do Paraguai”. O vendedor continuou seguindo os malucos e entraram em um bequinho. “Quer comprar um 38?”. O maluco que estava com o José e o Mano Pio ergueu a camisa e mostrou pro paraguaio o cano do revólver. “Eu já tenho um”. O maluco voltou de ré e sumiu no meio da multidão.

O Mano Pio pegou o 21 e ligou pro Mano Gê perguntando onde ele estava. Ele deu as coordenadas, uma lanchonete em um shopping próximo dali. Os três adentraram o shopping que estava bem movimentado; lá no fundo estava a lanchonete e podiam ver o Mano Gê comendo um lanche junto com um paraguaio. Os três sentaram. O Mano Gê pegou um jornal e colocou sobre a mesa. A matéria de capa trazia os dois policiais mortos, um deles sem orelha.

- Já viu o jornal, Zé?

José pegou o jornal pra ver mais de perto e reconheceu o soldado Farias.

(Lizal, na próxima edição mais um capítulo)