O trabalho desenvolvido pelo estudante Danilo George Ribeiro é intitulado As Muitas Faces de Foz do Iguaçu a Partir do Movimento Hip-Hop. Danilo cursa História na Universidade Estadual do Oeste do Paraná em Marechal Cândido Rondon e aproveitou os feriados e fins de semana para viajar pra Foz e fazer a pesquisa de campo. Em dois anos de pesquisa e estudo adquiriu com os manos do Hip-Hop local grande material fonográfico e informativo, além de fotos e diversas entrevistas. Alguns dos bairros visitados para fazer as entrevistas foram: Cidade Nova, Favela do Queijo, Favela da Mosca, Favela do Cemitério, Jd. Lancaster, além de acompanhar os shows que estão em constante movimento pelos bairros. Nas palavras do autor, o trabalho propõe discutir, numa perspectiva histórica, as linguagens que expressam práticas e relações socioculturais vividas a partir do Movimento Hip-Hop e da análise de Fanzines constituídas pelas articulações do Movimento Hip-Hop. Busca-se apreender dinâmicas tecidas pelas tensões e disputas vividas naquela realidade pela juventude das periferias que produzem outras significações de pertencimento, as quais conflitam com a memória hegemônica da cidade e as apropriações concedidas pela indústria do turismo. Dessa forma pretende-se perceber a cidade a partir do viver urbano da experiência periférica, no qual o movimento Hip-Hop aparece como possibilidade de expressões e narrativas desses sujeitos.
O estudo traça a trajetória do Movimento Hip-Hop em Foz do Iguaçu a partir dos anos 90 e como os ouvintes e amantes dessa cultura passaram a praticá-la. Narra a formação das primeiras organizações de Hip-Hop da cidade, como o MH2I e o Cartel do Rap e também o surgimento dos primeiros grupos, como o Mundo Iguaçu e o Aliados da Periferia. Segundo Danilo a pesquisa teve por objetivo abordar a constituição das periferias na cidade a partir da trajetória desse movimento. Nesse sentido, considerou o autor, que o Hip-Hop age como uma espécie de tradutor das expressões de memórias de moradores das periferias iguaçuenses, que de outras formas dificilmente se manifestariam.
Alguns dos grupos entrevistados durante o desenvolvimento do trabalho foram: Quinto Naipe, Mandamentos da Rua, Inimigos da Guerra, Santiago, Profecia da Fronteira, Conexão PB, e Toninho (esse um dos primeiros praticantes dessa cultura na cidade de Foz). O grafiteiro Woloco cedeu informações sobre o elemento grafite (um dos 4 elementos do Movimento Hip-Hop) que é bastante visível pelos muros da cidade. Mano Edo – poeta marginal em Foz – cedeu entrevista falando sobre a poesia da periferia, o elemento break e os projetos sociais de que ele participa. O trabalho aborda ainda as ocupações, que hoje já não se concentra somente nas áreas de periferia, mas também em regiões centrais.
O trabalho de Danilo buscou o resgate da história a fundo, desde a Quinta do Hip-Hop no bar Verdega, os eventos no Taberna, Café Concerto, Urbanus Bar e na Praça do Mitre. Os shows de rap nos bairros e os shows de grupos de outros Estados trazidos para Foz. Mostra o intercambio cultural com ativistas do Hip-Hop de Londrina (organizado pela Casa do Teatro) através de oficinas. O programa de rádio La Onda (comandado por Dj Caê), o Mortal Kombat de Freestyle, o beat box, o Break, o apoio das lojas Laysla e Vertical Hip-Hop, o Fanzine do Cartel do Rap e diversas outras atividades e acontecimentos dentro da cultura Hip-Hop local.
A respeito dos Fanzines – que na sua opinião é uma das maiores ferramentas de expressão – ele afirma: “os Fanzines surgem primeiramente como mais uma forma de manifestação, dando lugar a criticas, indignações, lutas, sonhos, denúncias que eram cantadas, e passam a ser escritas através de poemas, textos, pensamentos, e reposta a imprensa convencional. Através desse material percebemos uma nova possibilidade de expressão da favela. O Cartel do Rap a partir dessa produção de material não usava somente a música para atacar, contar e narrar fatos vividos: o Fanzine tem de certa forma um caráter conscientizador, e educativo”.
Esse é um trabalho digno de aplausos, feito com muita garra por esse guerreiro que é o Mano Danilo. Que apesar de estar morando em outra cidade, dispôs de seu tempo vago – que já é pouco – para pesquisar a cultura Hip-Hop mundial, nacional e local. Ele que até foi enquadrado pela polícia na Favela da Mosca e acusado de ter roubado um carro que estava estacionado na entrada da favela. O engraçado é que o carro era seu. Essa atitude da polícia para com os moradores do gueto, de chegar enquadrando, engatilhando e apontando armas e agindo com violência e preconceito, acusando os moradores da favela de ladrões, também está registrado em seu trabalho.
O Movimento Hip-Hop iguaçuense só tem a agradecer, ficamos sem palavras por esse trabalho que pra nós é como se fosse um troféu em merecimento a toda a resistência dos guerreiros que construíram o movimento na cidade. Fecho esse artigo com as palavras do Mano Danilo e sua percepção a respeito do Hip-Hop de nossa cidade.
“Quando iniciei minha pesquisa sobre Hip-Hop, no final de 2006, eu idealizava os lugares periféricos da cidade de Foz do Iguaçu como aquele local da pobreza, tristeza, exclusão, diferença, violência, preconceito, sujeira, exploração. Ao entrar nesse universo me deparei com um povo guerreiro que sobrevive às situações mais adversas e que renunciam ao posto de vítima e não sustentam a fraqueza que lhes são muitas vezes atribuída, e assim vão ultrapassando barreiras todos os dias, não somente aquelas barreiras impostas pela divisão de classes mas, aquela da diferença, do olhar preconceituoso, na qual muitas vezes colocamos como inexistentes da nossa parte, mas ao conviver com o “outro” nos deparamos com nossas próprias contradições. Assim fui com muita dificuldade renunciando a parte dos meus pré-conceitos, e adquirindo novas experiências. Inicialmente meus contatos nas periferias se deram com jovens e crianças dessas regiões que, como a de todas as outras partes, possuem sonhos, lutas, desejos, e um conjunto de sentimentos que permeiam nossas vidas; assim pude entender que antes da pobreza, exclusão e toda essa perversidade da nossa sociedade, existe uma vida, uma memória, uma trajetória, que formam um conjunto de relações que parcialmente busquei explorar através dos moradores dessas regiões aqui nesse trabalho. Dessa forma posso afirmar que esse trabalho inicialmente foi pensado visando a elaboração de um TCC, mas ao me envolver com essas pessoas e com estes locais tudo o que menos me interessa é a minha apresentação, a minha nota, a repercussão que este trabalho teve ou terá na academia, por que o que eu vivi e aprendi nesse trabalho de campo não irá constar no meu Currículo Lattes, nem me sustentará num concurso ou numa vaga de emprego, mas com certeza os valores aprendidos, o respeito, a consideração aqui empreendida, ninguém será capaz de tirar essa experiência de mim. (...)”.
NOTA DO EDITOR.
OBSERVAÇÃO IMPORTANTE:
O autor não teve a oportunidade de conversar com todos os militantes da cultura Hip-Hop local. Vale deixar claro que existem outras organizações na cidade que não foram citadas nesse trabalho como CIA de Rua (Prof. Michael), Urban Way (Pedro) e Fronic's (Cleo). Vale-se dizer também que o movimento Hip-Hop de Foz está em constante mutação e crescimento e após o término do trabalho já surgiram novas organizações como a Banca Forte e o Cartel do Break.
Veja o trabalho completo:
http://fanzinecarteldorap.blogspot.com/2008_05_01_archive.html
terça-feira, 9 de dezembro de 2008
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