quinta-feira, 21 de maio de 2009

QUANTO VALE A VIDA?! (Por: Antonio Ozaí da Silva).


No filme Live! (Ao vivo!)*, do diretor Bill Guttentag, a vida vale 5 milhões de dólares. O filme relata a história de Katy Coubert (interpretada por Eva Mendes), diretora de um programa da TV cujo objetivo é conquistar recorde de audiência. A idéia é produzir um programa baseado no jogo da roleta russa, algo capaz de superar os reality shows e impactar a sociedade. O jogo é conhecido: um revólver, seis concorrentes, uma bala, um morto. Eles sabem que um não sobreviverá. Os que saírem ilesos receberão o prêmio e transformarão suas vidas. Aos familiares do morto restarão apenas as lamentações e a dor, mas nenhuma recompensa financeira. Os de espírito mórbido poderão se deleitar com o espetáculo da morte. Na verdade, é o tipo de tensão que muitos precisam e encontram no rol dos programas oferecidos pela TV. A tese de Katy Coubert é que o público busca algo assim e ela apenas atende aos anseios deste, mas de uma forma que justifica o que oferece. O argumento é que o prêmio proporcionará uma vida nova – e as histórias dos escolhidos para participar da roleta russa parecem confirmar.

A vida que se esvai com a bala que dilacera a cabeça do “sorteado pelo destino” não tem qualquer importância. A atenção volta-se para aquele que seria o próximo a apontar a arma para a própria cabeça e apertar o gatilho. Enquanto o corpo jaz no auditório, todos festejam. Por que ter dó do morto? Não foi sua livre escolha? Eis o principal argumento para convencer as vozes dissonantes que poderiam impedir o programa. Se a liberdade é plena, tenho o direito de dispor do meu corpo e, em público, colocá-lo em risco. Quem tem o direito de impedir a minha opção se esta é a minha liberdade? Como é comum aos reality shows, o público tende a se envolver com os personagens, seus sonhos e dramas. O risco é passar a torcer para um deles e perder o senso crítico. Por outro lado, o filme representa uma vigorosa denúncia da TV, o que esta representa, os interesses que envolvem e o vale tudo para ganhar audiência e, assim, garantir os anunciantes. É interessante como Katy Coubert convence os representantes das empresas.

A venda dos produtos que comercializam é muito mais importante do que a vida humana; se a morte é um componente necessário para a propaganda e a realização dos lucros, paciência! É a sociedade de consumo que dá sustentação a coisas desse tipo. Isso, porém, é apenas um dos aspectos. Como argumenta a diretora do programa Live!, a identificação das multidões pela morte é antiga: a morte de gladiadores no coliseu romano, a queima de corpos nas fogueiras da inquisição, enforcamentos, cabeças decepadas pelas guilhotinas na França pós-revolucionária, execuções de escravos negros em praça pública, etc. O cumprimento da pena de morte no mundo moderno, a banalização da violência na TV com a transmissão ao vivo, e à exaustão, de casos como o das meninas Izabela e Eloá. Da antiguidade à modernidade, eis as multidões em êxtase diante da morte transformada num evento extraordinário e espetacular. De onde vem essa identificação? Quanto vale a vida? Cinco milhões? Mais? Ou nada? Depende das circunstâncias. Há quem seja capaz de matar pelo simples prazer da ação, sem qualquer recompensa financeira. Outros se colocam a serviço dos que não tem coragem de matar, mas tem dinheiro para contratar e pagar. Cotidianamente, muitos esvaem suas energias vitais a troco do suficiente para sobreviverem. Morrem a cada dia para prolongar a vida, ainda que esta seja miserável. As justificativas para a morte são muitas, até mesmo políticas – olhemos para o que acontece na Faixa de Gaza! Nem sempre é uma escolha feita em plena liberdade. Mas vale a pena ganhar cinco milhões se isto significou a perda de uma vida?

Fonte:www.antonio-ozai.blogspot.com

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