sexta-feira, 9 de outubro de 2009

TEXTO RESPOSTA SOBRE O PROERD E OTRAS COSITAS MAIS. (Por: Lizal)

Na edição passada do Fanzine escrevi um texto colocando a minha opinião sobre o PROERD e programas do gênero que envolva a polícia (aparelho repressivo do Estado) em atividades educacionais e culturais voltadas à população. Demonstrei no texto o meu ponto de vista de como eu acho perigosíssimo a intervenção da polícia na educação e na cultura, ferramentas que podem ser usadas para a libertação e emancipação do povo, para a construção de uma nova sociedade, uma sociedade justa, ao contrário dessa que está aí. A ex-coordenadora do PROERD no RJ, Tania Loos comentou o texto:

“Sinto-me a vontade para dizer algumas palavras sobre o "bandeide social" mencionado por Lizal: de antemão conheço bem a realidade do PROERD PR e em, especial, do PROERD em Foz, pois estive aí capacitando os Educadores Sociais do Programa. Lizal, não compreendo bem a sua visão, acho que vc está muito desinformado sobre o nosso trabalho em escolas, não estaremos educando seu filho, até porque essa missão é sua. Á educação do filho compete aos pais/responsáveis, nós das polícias militares brasileiras estamos apenas cumprindo nosso papel, ou seja, fazendo prevenção. Se os demais órgãos do sistema não funcionam o problema é de toda sociedade que elegemos e os colocamos lá, então não somos o bandeide social. Bandeide social são também os pais/responsáveis que se omitem na educação de seus filhos e depois tentam empurrar toda sujeira para debaixo do tapete”.

Vocês podem ler os comentários sobre o texto no Blog do Fanzine, Tânia diz que muitos policiais também moram em comunidades. O que é certo é que a polícia não tem consciência de classe e que já perdeu seu prestígio frente a população das favelas e periferias. Moram em comunidades, mas a grande maioria não se sentem parte disso, não possuem vínculos com a população e só estão esperando a oportunidade de meter o pé, sair da comunidade e só voltar pra reprimir esse povo do qual fez parte.

O Estado tentou e continua tentando de toda forma aproximar a polícia da população, criar uma polícia comunitária, mas até aqui tem falhado. Para um morador de favela como eu, a polícia mais próxima só fará com que eu fique trancado em casa, como muitos amigos meus estão fazendo, porque todos os dias são abordados na rua, com armas apontadas para suas cabeças e já levaram até tapa na cara quando tentaram dialogar. Essa é a “cultura de paz” que a polícia está tentando implantar, a cultura da paz sem voz. Estive no Morro Santa Marta no Rio de Janeiro, conversei com moradores e fiz algumas amizades. O governo contratou figurantes para simular uma convivência tranqüila entre a população e a polícia. Apareceu nas fotos e filmagens que foram veiculadas na televisão e jornais, policiais fazendo pipa junto com as crianças e a juventude praticando esporte na quadra em meio aos policiais. A realidade do cotidiano lá é bem diferente disso tudo, acabaram de construir um muro cercando a favela, simbolizando o apharteid social que vive as comunidades. Além disso as manifestações culturais e artísticas da população estão proibidas. Outra parada é o Prêmio Polícia Cidadã, realizado pelo Cesec e Afroreggae, uma iniciativa que tem o objetivo de valorizar ações policiais que tenham “colaborado para reduzir a violência” e difundir práticas criativas de soluções em segurança pública. O poeta Deley de Acari postou um texto em seu Blog onde diz:

“Hoje de manhã ocorreu mais uma quase rotineira invasão policial em Acari. Mais de 40 policiais das DRACO E DRAE como sempre, violaram portas com chaves michas e invadiram casas de moradores sem mandado de busca, puseram armas na cabeça de crianças sozinhas em casa, roubaram dinheiro guardados em gavetas de moradores ausentes. Tudo como sempre, tudo como foi, tudo como sempre será, ou não? O que ouve de diferente, especial? De especial ouve a participação especial de uma equipe de filmagem desconhecida capitaneada por José Junior, diretor-executivo da MegaONG Afro Reggae, com seus tradicionais brinquinhos dourados, colete á prova de balas e uma pistola na cintura oculta sobre a camisa”. (Vejam matéria completa no Blog do amigo: ww.deleydeacari.blogspot.com).

Eu li o comentário de Tânia há poucos dias na Lan House da vila. Quando cheguei na Lan, fiquei sabendo que a polícia havia acabado de fazer uma batida no local e colocado todas as pessoas - inclusive crianças - com as mãos na viatura. Além de ter que ouvir uns desaforos e serem humilhados, foram intimidados com armas apontadas para elas. Voltando da Lan House passei em frente a casa de uns amigos onde a galera se reúne pra ouvir música e curtir, namorar, se divertir, coisas que os jovens fazem. A casa já foi invadida várias vezes pela polícia. Porque a polícia não pode ver mais de duas pessoas reunidas que já abordam? Resquício da ditadura militar no Brasil? As reuniões são perigosas? Próximo da casa encontrei um amigo que me contou que no começo da semana foi abordado na rua pela polícia e levado preso como suspeito de ter praticado um assalto. Ele é trabalhador e foi algemado na frente da mulher e do filho. No final liberaram porque a vítima disse que não era ele o assaltante.

Outro dia eu estava conversando com um parceiro e ele me disse que classifica a polícia militar de Foz em três categorias: “A primeira é a que mata, puxa o gatilho sem dó. A segunda é a que bate, desce o braço sem dó. A terceira é a que humilha, xinga sem dó”. A questão agora não é estudar no PROERD ou não, e sim que pra essa polícia que está aí nós sempre seremos os bandidos, os vagabundos, os ladrões, os drogados, os traficantes, assaltantes e assassinos, independente de ter estudado no PROERD ou não. Nós vivemos uma luta de classes e a polícia está aí para assegurar os interesses da elite econômica e cuidar de seu patrimônio.

Tania disse que a polícia militar está só cumprindo seu papel.

Eu concordo, e está cumprindo muito bem. O papel do opressor.

(Lizal é morador de favela em Foz e já foi várias vezes humilhado pela polícia, já apanhou e já foi ameaçado de morte. Ele conversa com muita gente e percebe que muitos passam pela mesma situação. Sempre que pode ele faz músicas e textos criticando o aparelho repressor do Estado).

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