domingo, 2 de agosto de 2009

Tinha um anjo em meu portão batendo palmas (Por Carol)

Dia de entrevista. Há algum tempo ela está desempregada. Sai de casa perfumada e bem vestida. Passa pela cozinha abre a porta e dá de cara com um menino no portão da sua casa. O menino olha pra ela, assovia e faz um gesto olhando para a esquina. A mulher para e fica olhando. Não estava com medo, estava apenas prestando atenção. O menino aproxima-se do seu portão e diz:

-O tia, não tem alguma coisa pra comer?

-Peraí vou ver que aqui também não ta fácil...

A mulher entra e caça alguma coisa pra entregar para aquele menino. Em alguns minutos ela volta trazendo nas mãos um pacote de bolacha.

-Olha o que eu posso te dar ta aqui. Um pacote de bolacha. Pode ser?

-O tia ta firmão! Mas não tem um pacote de arroz?

-Xi, cara! Aqui também ta complicado... Vou ficar te devendo essa...

A mulher sai de casa e o menino a acompanha até a esquina.

-Aquele mano ta te esperando?

-É, é meu irmão. Ele veio pra me ajudar a levar o carrinho que tava pesado.

-Hum... E a chuva zico o trampo de vocês hoje, né?

-Xi, tia nem me fala. E lá em casa ta embaçado. Mó treta.

-Boto fé.

-O tia, mas você bonita e cherosa desse jeito não podia falar assim comigo...

-Ué?! Por que?

-Sei lá! Ninguém fala...

-O cara, nem conta pra ninguém que me viu assim. É que hoje to disfarçada de robozinho do sistema.

Os dois caem na gargalhada.

-Sabe qual é? É que hoje vou ver um trampo. Mas e aí! E já ta de férias?

-O que?

-Você não estuda?

-Ah... Não estudo não. Faz pouco tempo que vim pra cá. Lá onde eu morava tava mó ruim. A minha mãe não tinha nem emprego. Aí agente veio pra cá. Olha tia, vou ficar por aqui pra ver se eu consigo mais alguma coisa.

-Tá certo! Boa caminhada...

A mulher senta-se na cadeira amarela da padaria e acende um cigarro enquanto o ônibus não vem. Dali a pouco percebe que o menino vai até seu irmão e entrega o pacote de bolacha. Os dois sentam-se na esquina, comem um pouco e guardam o restante na sacolinha que continha um pacote de feijão e um pacote de sal.

O ônibus veio. Os meninos ficaram. Ela se foi. Talvez nunca mais os veja... Antes de dormir ainda lembra da risada que tirou daquele pequeno homem.


(Carol é estudante de letras em Foz)

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