segunda-feira, 7 de dezembro de 2009

CEMITÉRIO DE ELEFANTES (Por: Deley de Acari)

Há um tempo atrás, uns dois anos se muito, durante um dos vários "arranca rabo" que tenho com Wesley, devido as divergências de encaminhamento de nossas ações na favela, aos poucos segundos do fim do último round, ele me desferiu um direito de direita, em ambos os sentidos. Não me lembro bem as palavras exatas: “E você que tá aqui na favela dando murro em ponta de faca há mais de trinta anos e não conseguiu mudar nada. Cadê a revolução que vocês iam fazer? Que que vocês fizeram pra mudar a favela? Nada!”

A verdade dói, mas a verdade é verdade.

Dos cinco comunistas pobres sem vergonhas de Acari, quatro já morreram, eu sou o único vivo, mas que já sofreu três atentados e está jurado de morte por algozes que não costuma deixar passar muito tempo sem cumprir suas sentenças de morte. Hoje sei que já vivi o bastante uma auto-fragelada, mas, vital auto-critica diante da constatação wesleyana: a verdade é que nós comunistas favelados somos mesmo uns comunistas pobres-sem-vergonhas, que além do peso dos anos, temos a nos vergar o lombo o peso do fracasso de não termos feito a revolução popular comunista que nossos pais e avós esperavam da gente e ainda padecer da vergonha de envelhecermos vendo o capitalismo, na sua forma mais cruel e desumana avançar favela a dentro, fazendo do tráfico de drogas, outrora, quase uma economia de subsistência familiar comunitária, transformado no mais rentoso e lucrativo mercado capitalista neoliberal, para-formal.

Há uns seis anos ainda havia num canto de rua de Acari, um banco de cimento onde os velhos comunistas de Acari sentávamos pra chorar nossas pitangas soviéticas. A maioria tinha o pé-de-pilão resultado de muita cachaça ou frebite fruto de muitas decepções políticas e familiares. Por isso autodenominamos o local de Cemitério de Elefantes. A obra do Favela-Bairro derrubou o banco e o muro que havia atrás dele e que tinha inscrições de nomes de bandidos mortos, de bin laden, de saddam, de che e de maicon jequissom, que ainda não tinha morrido mas já tinha ficado branco. Mas, nada de nomes de grandes líderes comunitários que fizeram a história da resistência popular da favela, nem muito menos, de militantes comunistas favelados como Nilton Mendonça, Milton Branco, Seu Cesário, Seu Nestor...

O que sem duvida, é mais uma prova do quanto a critica, ácida, corrosiva, mas correta do wesley faz sentido. Comunistas pobres favelados, somos tão sem vergonhas que, e não fizemos nada, nada pra favela, de bom, nestes últimos trinta anos, que sequer merecemos nossos nomes rabiscados num muro de canto de favela. Ao contrário de traficantes locais, revolucionários latinoamericanos, e terroristas mulçumanos ex-aliados do USA e artistas negros embranquecidos.

O último comunista pobre favelado sem vergonha, a morrer em Acari, morreu de desgosto, cachaça e diabetes, frustrado por não conseguir impedir, mesmo com toda sua marra de comunista revolucionário, que suas filhas e netas se tornassem esposas e viúvas de bandidos. Com certeza essa é a maior derrota pra uma marxista leninista favelado. Ver as mulheres de sua família escravas, objetos sexuais. Logo a gente que éramos pró-feministas, ao menos no discurso, mas machistas leninistas na pratica cotidiana.

(Fonte: www.deleydeacari.blogspot.com)

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