Eu sou um cara que acredita que o mundo pode ser muito melhor e feliz. Mas ser assim causa uma série de transtornos, confesso. Há algum tempo venho tentando me desvincular de tudo que não fez bem para minha vida e, principalmente, para a vida da sociedade. Já faz algum tempo que excluí a televisão da minha vida. Medida radical para muitos, para mim foi uma decisão que poderei incluir entre as mais corretas que já tomei em minha existência. Claro, caro leitor, existem vantagens trazidas pela televisão como a informação jornalística e o cinema mas, em relação a primeira, eu prefiro procurar me informar com a internet ou em um jornal impresso (como este), onde eu posso escolher o que vou ler e não deixar uma caixinha iluminada (ou um moderno televisor de plasma) decidir por mim. É estranho, eu sei, mas sou feliz assim.
Outra novidade excêntrica é que não quero mais ter carro. Depois que vendi meu último, decidi abrir mão deste conforto. Lá em casa a discussão é pertinente, mas resolvo dizendo: podemos ter um carro sim, mas eu, quando estiver sozinho, vou me locomover sem. Já havia feito isso uma vez, quando morei em Porto Alegre. Tomei a decisão quando vi que o governador do estado na época, Olívio Dutra, ia de transporte coletivo, diariamente, até o Palácio Piratini. Quando perguntado o porquê pela mídia carniceira ele responde: “ eu sempre andei de ônibus”. Desde então passei a me deslocar usando os meios disponíveis: de ônibus (ou de táxi quando chove muito).
Quando viajo, pego ônibus do centro ao aeroporto e, chegando no destino, já me informo sobre as linhas. Geralmente me viro bem. Sei que o transporte coletivo no Brasil não é lá essas coisas, mas acredito que não resolveremos o problema se simplesmente comprarmos um veículo particular para fugir dos transportes de massa. Imaginem o dia em que todo o brasileiro realizar o sonho de ter o carro próprio? Vai ser um caos terrível! Vamos ter que tirar as casas e os gramados para construir mais e mais avenidas, aquelas chamadas arteriais que, ao contrário do nome, não levam vida nem oxigênio, mas sim o cinza e o barulho. Nossas cidades e nosso ambiente não vão suportar.
Pois bem... O que mais me agrada em pegar coletivo é poder reparar nas pessoas (claro, quando o ônibus não está muito lotado, aí a gente só quer sair lá de dentro) e pensar na vida. Tenho, também, aproveitado para relembrar minha infância, quando morava na Vila A. Minha mãe me trazia para o centro de ônibus. Eu adorava ficar sentado perto do motorista e ficar ouvindo o barulho do motor (que hoje acho horroroso, confesso). Mas o que mais me fazia feliz naqueles instantes era poder puxar a “cordinha”, uma espécie de fio de varal que serve para dar o sinal para parar. Lembro-me
que eu pedia para minha mãe (ou minha irmã Lígia) me erguer só para que eu puxasse. Quando somos crianças a felicidade é fácil e simples. E as crianças adoravam pegar ônibus. Isso ainda era no final da década de 80. Naquela época ainda embarcávamos pela porta de trás e, caso o leitor se lembra, a cordinha poderia ser puxada várias vezes, ao contrário de hoje, que ela só dá sinal uma vez.
Esta semana aconteceu algo muito triste no pequeno mundo que ainda tenho dentro de mim. Peguei um ônibus perto de casa em direção ao centro e, quando resolvi descer não encontrei a cordinha. Simplesmente não havia. Há muito tempo eu já sabia dos botões “baixos” que facilitavam a vida das pessoas de pouca estatura e dos portadores de necessidades especiais, mas eles (os botões) conviviam em harmonia com a corda do sinal. Mas abolir a cordinha foi, em nome do progresso, um retrocesso ao costume. Senti-me como um senhor de idade que entra no banco e tem que sacar seu dinheiro num caixa eletrônico. É difícil. Sai do cotidiano. Muda nossa vida de surpresa. É terrível.
(Luiz Henrique Dias da Silva é escritor, estudante de Arquitetura e Urbanismo e comunista (convicto). Ele se diz um analista Urbano-Social e costuma andar por aí, tirar fotos e conversar com as pessoas. O Luiz se preocupa com pequenos detalhes da vida como as “cordinhas” do ônibus. Achamos que isto é uma espécie de distúrbio. Não iremos recomendar um psicólogo desta vez. Já fizemos isso e ele não foi. Desistimos).
segunda-feira, 7 de dezembro de 2009
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