domingo, 5 de julho de 2009

AS MUITAS FACES DE FOZ DO IGUAÇU (Por: Danilo George e Eliseu Pirocelli).



Arinha - Casa do Teatro



Arinha Rocha tem 40 anos e nasceu em Umuarama-Pr. Sua família veio para Foz do Iguaçu em 1976 em busca de melhoria de vida. A construção da barragem de Itaipu parecia uma boa alternativa, uma vez que seu pai trabalhava em obras. Seu pai trabalhou inicialmente no lado Paraguaio da barragem e para ele era tudo novo, pois se mal conhecia outras cidades do Paraná, ela lembra que a família passou bastante dificuldade, pois no ano de 1977 a obra já estava bem encaminhada e boa parte dos obreiros foram despejados. Moraram em casinhas alugadas por “KID” que era um pistoleiro que fazia serviços para um político da cidade, posteriormente a família se mudou para o PROFILURB que eram casas nos estilos BNH, programas populares de habitação para trabalhadores que chegavam dos mais diversos estados do Brasil. Arinha cresceu na região do Porto-Meira, sobre sua infância diz que “Morar em bairro é um barato neh, muito bom, conheci ali um povo batalhador que vive com poucas oportunidades, dançava nas danceterias dos botecos, estudei e trabalhei na escola do bairro, conheci todas as professoras e construí boas amizades lá”.

Arinha já trabalhou vendendo vassouras, picolé, jornal, sonhava em trabalhar em escritório e assim foi trabalhar na prefeitura como secretária. Para conseguir o emprego ela revela que ia para a prefeitura às 7 da manhã e ficava até a meia noite na prefeitura, formalmente esse foi seu primeiro trabalho. Depois, após concluir a graduação de ciências contábeis, começou a trabalhar em escritório de contabilidade, aí depois de muito tempo começou a fazer curso de teatro na época em que se tinha iniciado a Fundação Cultural do município, o Sílvio e toda galera trouxe um curso de teatro. Depois foi para São Paulo, onde residiu por nove anos, mas voltou pra Foz do Iguaçu com o sonho de construir um grupo de teatro. “Foz do Iguaçu é uma coisa bem louca, uma relação de amor e ódio, eu ainda tenho amigos de verdade aqui, eu conheço várias partes de Foz, saí muitas vezes daqui e voltei. Acho aqui magnífico, tem pessoas incríveis, você vai num bar que você vira amigo do cara, eu sou meio refém de várias pessoas batalhadoras e luto por elas para que aconteça alguma coisa, e o ódio é com algumas coisas daqui principalmente com a administração pública”. “Eu sempre fui envolvida com as coisas mais políticas neh, quando eu era adolescente ajudei a criar no Porto-Meira um grupo chamado Jovem em Ação. Eu tinha 13 anos e a função desse grupo era escutar a população local. Nós usávamos o espaço da creche, mas a gente não fazia nada para lugar nenhum, era algo Anarquizoide, mas lá desabava um pouco das angústias e das vontades dos moradores. E aí conseguimos encontrar um dia um ex-exilado da política paraguaia e ele viu naquilo ali uma possibilidade de começar a fazer que as pessoas pensassem, e ele criou uma biblioteca nesse grupo pra gente ler. Líamos Eduardo Galeano, aí eu queria mudar o mundo, esse cara foi uma pessoa importantíssima e meu irmão também influenciou criando atividades que nos ajudassem a pensar na verdade. A gente participou inclusive na ditadura Paraguaia, fizemos greve de fome também, começamos a participar politicamente também da cidade”.


Movimento juvenil no Porto-Meira


“Então essas coisas fizeram que eu tivesse vontade de criar as coisas, aí veio o teatro que foi algo que me apaixonei, eu fazia desfile de moda no bairro do Porto-Meira, então assim eu sempre participei de algum jeito da comunidade e das coisas. Aí o teatro me fez encontrar o que eu sonhei, aí nunca dava pra gente fazer uma coisa e eu comecei a querer fazer só teatro, não queria mais participar de movimento, só queria teatro. Só que a cidade nunca deu oportunidade para que as coisas acontecessem única e exclusivamente, como tudo que ta começando a gente teve que criar público para tudo que a gente fazia. Aí começamos a chamar as pessoas e a gente criou a Mostra Nacional de Teatro que foi cinco anos. Veio gente do Brasil todo, grupos extremamente respeitados do Brasil e de fora, então começamos a participar do movimento cultural. Você pensa política e vai participando das coisas e uma coisa vai misturando com a outra e aí a paixão pela arte e o teatro me levou”.


Casa do Teatro




Nós temos um grupo chamado Teatro e Companhia que é de 1992, a criação em documento, mas na verdade já faz mais neh, em 1988 eu já fazia teatro aqui em Foz, só que o grupo foi registrado em 1992, aí a Casa do Teatro fazem seis anos por que eu achava que pro grupo faltava algo. Aí resolvemos criar a idéia da Casa do Teatro para consolidar o povo, espaço, todas as coisas que faltavam”. “Hoje o que a casa do teatro faz é oficinas, tem trabalhos de recreação, rodas de conversas, fazemos o Café com Teatro. Hoje a gente podia fazer só teatro, mas achamos que devemos nos envolver em outras possibilidades como musica hip-hop, cinema, pessoas que fazem qualquer coisa, essa movimentação é melhora para todo mundo. A casa do teatro é meia hibrida e faz um pouco de cada coisa”. “A casa tem um projeto com o ministério da cultura que são do ponto de cultura e parte das oficinas que a gente faz são pagos pelo ponto de cultura que vai até o ano que vem. Começou ano passado e tem duração de três anos. Temos trabalhos em bairros, visando a cultura popular e um trabalho com a ITAIPU Binacional também, atualmente esses são os dois trabalhos que temos”.

A casa é uma ONG?

“Na verdade ONG é não governamental, nós não somos governo então somos uma ONG. Todo mundo tem um pouco de resquício de dizer ONG, mas na verdade somos uma organização de artistas que trabalham com a cultura”. “Temos várias dificuldades. Primeiro por que as oficinas não são pagas, e não cobramos por que cada dia acho que temos que formar pessoas que gostem de arte, lutamos para não acabar e estancar a arte, por que se eu fizesse só espetáculo nós não temos espaços para fazer arte, se eu tivesse um espaço público e me apresentasse semanalmente... mas, na verdade aqui em Foz apresentamos de forma esporádica por falta de espaço.Então se você não fizer nada até acontecer uma peça de teatro as coisas esfriam, então mantemos a oficina aonde não se paga e mantemos ela por que achamos importante. Muitas coisas que nós fazemos não tem da onde tirar o dinheiro, as vezes a gente acaba pagando para fazer e manter as coisas aqui, então passamos dificuldade, a casa tem que pagar água, luz e telefone. Temos esses custos fixos que precisam ser pagos. Então temos que bancar a nossa estrutura”.

Viver de Cultura

“Quem vive de cultura é resistente, quem trabalha nessa área é mais por teimosia do que grana, fora que muitos não vêem isso como trabalho e acham que você é vagabundo. A cidade aqui tem que começar a imaginar uma outra coisa, olhar para fora e perceber como se desenvolve uma cidade, para ela desenvolver culturalmente ela tem que se pensar de uma forma que a vida é trabalho, lazer, educação, se não tiver isso não é um ser completo e a gente tem que estar pensando a população como um ser completo neh, a cultura ta no meio dessa gama é um índice indispensável na vida de qualquer cidade. Não é pensar em ser maior, é pensar no seu povo como pessoas portadoras de direito”.

Cultura de Violência

“Eu acho que a cidade tem que caminhar muito, olhar para fora e entender como que se faz, um colega meu diz que Foz sofre do mal de malinche que é uma tribo indígena que se apaixonou pelos brancos e por tudo que veio de fora, pararam de fazer tudo que faziam e deixaram os brancos fazerem e quando os brancos entraram na tribo também trouxeram o mal e a doença do malinche que exterminou seu povo. A cidade tem que entender que ela passa por isso, nós não temos amor próprio, as pessoas daqui tem que acreditar que são capazes de fazer e tem que saber o que produz e a cultura é feita pelas pessoas que moram aqui, então quando falamos de Foz lembramos que ela tem uma cultura de violência terrível. Isso tem que ser mudado por algo interessante, os meninos produzindo nas periferias o hip-hop, circo e música por que a violência só vai mudar se a gente introduzir outras coisas lá. Temos que ter uma política pública que de uma juntada nisso e desenvolver um trabalho que nos leve adiante. Existe aqui em Foz produtores de cultura e lutamos para que não morremos do mal de malinche, acho que as pessoas daqui tem que olhar para esse caldeirão e pelas coisas produzidas aqui, fomentando o que vem daqui por que se não vira uma idiotice de que tudo que vem de fora é bom e o que tem aqui não significa nada”.

Itaipu e a cidade

“A cidade aqui é nova, eu acho que a cidade começa quando Itaipu começa. Falam que aqui tem 90 anos, mas na verdade aqui antes não tinha nada, pra mim começa a Itaipu começa a cidade. Isso me lembra a parte da bíblia dos ataques dos gafanhotos, muitos gafanhotos estão aqui comendo tudo, mas depois vão embora. Eu espero que venham pessoas iguais a vocês que estão querendo descobrir o que a cidade pensa através de várias visões, todo mundo aqui tem um parâmetro do que a cidade enxerga de si, eu tenho 40 anos e espero que os jovens achem que vale a pena lutar e toquem o barco”.

Cultura e transformação social

“Eu sou muito apaixonada por essa cidade, meu discurso é muito apaixonado eu já conheci cidade que a cultura transformou a forma do povo olhar. Quando você conhece e produz alguma coisa muitos começam a ser dono do espaço, aí é a diferença você tem um lugar então depredamos menos a escola, por que a escola é sua; você destrói menos o orelhão por que o orelhão é seu. Cultura não é só a arte, a arte é parte da cultura, quando se trabalha com arte você se discute a cultura da cidade, você faz com que as pessoas se apropriem do que é delas e toda noção que você tem da cidade muda. Você chega em São Paulo, sabe, naquela cidade gigantesca, as pessoas vão ao teatro e não só a classe média e alta são as pessoas da cidade. Na rua tem espetáculo por que lá as pessoas tem orgulho em dizer eu sou daqui. Em Porto Iguazu na Argentina não tem um prédio chamado Teatro, mas eles reconhecem a rua como espaço deles, o pessoal vai pra rua fazer espetáculo e a galera participa, então você vê um povo reconhecendo aquele espaço como deles. Tudo que acontece lá é importante pra eles, a participação lá é muito, aqui em Foz parece que as coisas são distantes das pessoas, tipo aquilo não faz parte da minha vida, aqui por ser uma cidade de turista então um teatro aqui não altera a ordem da cidade, mas sempre aparece cinco, seis gringos aqui. A cidade carece disso, desses espaços, inclusive para segurar as pessoas que vem para a cidade, que aqui é cassino, compras, aqui fora o turismo tem o que? Aqui poderia ter um bom teatro, bares interessantes, coisas acontecendo nas ruas. Muitas pessoas que vem aqui são mochileiros e aventureiros como a gente, que nem quando você vai pro Chile, vai pro Uruguai, então você quer conversar com as pessoas da cidade, descobrir o que elas fazem, então as pessoas querem conhecer o povo, e aqui nós temos que fazer muitos entenderem isso: o povo é parte da cidade, não existe prédios diferentes das pessoas que moram lá, se você entender isso você entende que isso tem que ser povoado de cultura. Eu acho que a cultura muda tanto a questão econômica quanto aos conflitos, assassinatos, por que as pessoas têm que estar ocupadas, serem donas do que estão fazendo, temos que ver que as coisas podem ser diferentes”.

Governantes

“Cultura não é o interesse dos governantes dessa cidade, nunca foi e continua não sendo, é uma coisa que não levaram em conta que é interessante. Eu tenho uma crítica as pessoas que são donas da cidade, que são as pessoas que mandam, neh: se você nunca viu, você não vai entender para o que é que serve. A falta de integração latino-americana perpassa pela cultura, a língua é uma dificuldade, mas acho que ainda é uma fronteira pequena quando pensa que as pessoas querem se encontrar. A gente aqui quer conhecer outros povos e entender, muitos dizem que aqui a gente vive harmonicamente com não sei quantas etnias, mas harmonia não é ausência de guerras, harmonia é quando você consegue dialogar com essas diferenças. Eu vejo que não há diálogo, as culturas só vivem aqui. Então a cidade tem dificuldade desde a criação e temos todos os problemas políticos neh, desde a guerra do Paraguai, a dificuldade que a gente tem, e a relação estreita do MERCOSUL, mas por isso acho que a cultura seria uma forma de romper isso de fazer as pessoas se encontrarem e ligar menos para preconceito. A juventude tem muita facilidade de diálogo e de adentrar no mundo do outro, isso tudo perpassa pela cultura e eu acho que é uma forma de integração. Muitos pensam em criar documentos e assinar dois, três países, mas não se rompe, para entrar na Argentina tem tudo uma dificuldade, mas quando apresentamos lá levando cenário e figurino os caras até cumprimentam a gente, 'á!!! vocês são do teatro'. Quer dizer, tem um mundo que parece que não é muito oficial e que as pessoas caminham por isso, muitas vezes o pessoal do Paraguai faz som aqui, eu acho que não é oficializada a coisa, mas existe um encontro, mas ainda é pequeno”.

FERNARTEC

“Aqui tudo que começa termina, mas para mim a feira nunca representou integração de nada, mas lamento por ter terminado por que é mais um perda para a cidade, nunca fui assídua freqüentadora, essas feiras são uma tristeza”.

Integração Latino-Americana

“Tem muitas dificuldades, neh, politicamente é complicado, porque não é uma coisa que se faz porque quer., é política e jogo duríssimo. Pensamentos diferentes, nosso presidente, os outros presidentes., tem muita dificuldades porque politicamente não sei nem se é muito interessante assim. É muito complicado, não é assim uma integração, neh. A gente acha que integração é você conversar com o outro. Integração deveria ser muito mais que isso, deveria ter coisas acontecendo e a gente poderia, por exemplo, estudar no Paraguai sem muita dificuldade, ser aceito aqui no Brasil sem muita dificuldade, até porque a maioria é muito equiparado a qualidade das escolas, das faculdades. Mas passa por muita coisa, por muita dificuldade, politicamnete é muito diferente. Mas oxalá se a gente tivesse muito mais integração, fortaleceria a america-latina toda . É um sonho de todo latino-americano, sonho meu, Mercedes Sosa e tanta gente que já até morreu sonhando com isso”.

SONHOS

“Agora, a gente tava até conversando com os meninos que tem viajado a América-Latina, o sonho, acho que todas as pessoas que moram por esses quinhão, que tem a mesma dor, que sofre as mesmas coisas, que é matado pelos mesmos, sacrificados pelos mesmos, que são o povo latino-americano, oxalá que a gente conseguisse acreditar que nós somos o mesmo povo, neh”. “Não acredito que tenha uma grande mudança, mas eu torço para que ele aconteça”.

Para saber mais sobre a Casa do Teatro acessem: WWW.casadoteatro.org.br

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