sexta-feira, 8 de janeiro de 2010

2010, QUE OS FAVELÓLOGOS NÃO LUZEM MAIS QUE AS MÃES CORAGEM! (Por: Deley de Acari).

Em homenagem a D. Aparecida, MC Betinho e Pâmella Passos.

No Inverno de 1987 foi realizado em Petrópolis o 3º Encontro Nacional de Poetas e Ficcionistas Negros. Dos 57 participantes, a maioria, 29, eram de mulheres negras, poetas e ficcionistas. Profissão de necessidade: mais de 90% éramos funcionários públicos. Dentre todos, o único poeta e escritor negro favelado: eu.

Na verdade havia uma mulher negra, escritora favelada, que em momento algum deixou de estar presente no nosso encontro, se bem que nas falas e nos debates... nas reflexões de todas, todos participantes do Encontro: Carolina Maria de Jesus, escritora negra favelada de Sampa, falecida 10 anos antes, 1977. Passados 23 anos daquele histórico encontro, não há registros de poetas e escritoras negras faveladas no Coletivo de Poetas e Ficcionistas Negros Brasileiros, 32 anos depois da morte da Carolina de Jesus e, no limiar das comemorações dos 60 anos de lançamento do seu primeiro livro: Quarto de Despejo. As mulheres negras de uma maneira geral, e as da favela e da roça, em especial, são hábeis historiadoras e memorialistas de seu povo.

Carolina de Jesus e Geni Guimarães são provas disso. Geni tá bem vivinha aí entre a gente pra falar melhor que eu. Ambas viveram a experiência de serem mulheres, meninas negras na roça, e na cidade. E souberam, e sabem como poucas, por no papel, escrever em verso e prosa escrita, arte literária escrita. Arte negra. Em 1987, não havia muitas mulheres negras de favela e da periferia nas Universidades, as que lá estavam cursavam, a maioria, comunicação, letras, história... Hoje, mulheres negras de favela e periferia, e até da roça, são em bem maior número nas universidades, pelo menos nas públicas, que eu conheço. Claro, se bem em menor número que deveriam. As que lá conseguiram chegar, como há 22 anos passados, estão em grande número, cursando as mesmas cadeiras. Porque, ou por que? Nunca sei, sobre esses quês... Saem da universidade, a maioria imensa, como professoras, pesquisadoras, ongueiras, em bem pouco, como poetas e escritoras? Historiadoras da história de seu povo afrodescendente... Mas, das mulheres que afrodecendentes, personagens importantes na história da Diáspora Africana nas Américas?

Durante a ocupação do movimento estudantil, na UERJ, conheci e conversei com algumas estudantes de letras, ficamos de marcar um tricô pra conversarmos sobre isso. Agulhas, linhas e vontade não faltaram. Faltou tempo, e prioridade para deixar vir a lume a palavra linguagem poética escrita e oral, não só das mulheres negras da favela e da periferia que estão nas faculdades, e das que estão na pista.

Em 2010, é um ano histórico pras mulheres negras de favela e periferia: 60 anos do lançamento do livro Quarto de Despejo, da Carolina de Jesus, 180 anos de nascimento do poeta, jornalista e advogado Luis Gama, filho de Luiza Main, africana-brasileira revolucionaria de umas seis revoluções populares no Séc. 19 e 20, na morte dos filhos das Mães de Acari. Ao contrário do que se possa pensar, há pelos menos três mulheres negras de favela e periferia prontas a por a lume, as trágicas histórias de suas vidas, mais que história de tragédias pessoais. Histórias da vida coletiva do povo negro da favela e da periferia. A história de vida de D. Penha, mãe do pequeno Maicon, D. Maria Aparecida, mãe do MC Betinho, da Força do Rap e de Marilene Lima, estão lá em suas gavetas, em cadernos amarelados e folhas de papel oficio amarrotadas, prontas, não a virar objetos de estudos e pesquisas de favelologos de plantão, mas diários, crônicas, poesias e ensaios de próprio punho e própria voz delas mesmas.

Vocês devem estar se perguntando porque Pâmella Passos está sendo homenageada neste texto. Tudo bem, eu digo, mas não digo tudo agora... só digo que: Pâmella Passos e MC Betinho da Força do Rap fazem aniversário, dia 30 de Dezembro, Pâmella, não sei quantos anos... MC Betinho, faria 31 anos, se não tivesse sido assassinado covardemente por policiais do 09º BPM em 17 de Dezembro de 2001, 13 dias antes de fazer 23 anos. MC Betinho é filho de D. Aparecida, ávida e desesperada pra contar a verdadeira história de seu filho, que ficou para a historia das páginas policiais, como um bandido morto em confronto, em auto-de-resistência... Não satisfeitos? Pâmella Passos é mulher negra, historiadora, ensina história para jovens da periferia. As vidas de D. Penha, D. Aparecida e de Pâmella se enlaçam: MC Betinho foi morto pelos PMS em represália ao apoio que a Força do Rap deu a família Maicon quando o pequeno foi morto.

Na verdade, a vida de Pâmella só se enlaçará com a dessas mulheres, se ela se quiser enlaçada.

Fonte: www.deleydeacari.blogspot.com

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