segunda-feira, 7 de dezembro de 2009

AS MUITAS FACES DE FOZ DO IGUAÇU ( Por: Danilo George e Eliseu Pirocelli)

TITI, SKATE-HARDCORE-HIP-HOP



Adriano Lopes da Silva, mais conhecido com Titi, tem 32 anos e é natural de Mato Grosso do Sul. Veio pra Foz com 02 anos de idade, o seu pai não era barrageiro, mas veio pra cá com a promessa de que em Foz teria bastante chance de emprego em decorrência da construção da usina de Itaipu. Se criou no Campos do Iguaçu, mas atualmente mora no Jd. Alice. Teve uma infância típica de crianças de periferia, fazia seus brinquedos, espingardas, revolveres, carrinhos de rolimãs, pegava latas pra batucar, andava descalço nas ruas de terra, correndo, brincando de esconde-esconde, subindo nas árvores.

“Eu cresci num ambiente vendo tudo quanto é tipo de pessoa, vendo coisas boas e coisas ruins, né. Foram muitos amigos que se foram, muitos que ainda estão aqui hoje. Da minha infância até hoje foi um longo aprendizado, né, e graças a Deus eu to aí vivo até hoje”. Ele critica o formato de sociedade de hoje: “O ser humano cada vez mais quer digerir as coisas já prontas, entendeu, ele não usa mais a imaginação, ele pega os subprodutos, os enlatados já na mão. O ser humano está perdendo cada vez mais o seu lado natural, de ser humano mesmo, e a tendência é ele se mecanizar, se tornar um robô, igual a gente vê nos filmes ”.

Quando chegou em Foz em 1978 o Brasil ainda vivia uma ditadura militar. Questionado se ele lembra na sua infância de como era essa época ele diz:

“Eu ainda era muito pequeno e não tinha sabedoria pra discernir o que era a ditadura militar e a repressão por parte do regime militar, mas conforme eu fui crescendo eu ainda lembro dos depoimentos que passavam na TV, da repressão que o povo sofria por querer buscar sua liberdade, principalmente a liberdade de se expressar”.

Titi sempre foi uma pessoa eclética que ouviu vários estilos musicais. Desde Hip-Hop, Reggae, Black Music, Funk, Soul, Punk, ouviu muita música de protesto. Ele acredita que os manos que adotam a postura de ouvir só Rap acaba tendo mais base para fazer e falar de Rap, mas acaba fechando a mente pra outras coisas e se limita.

“Quando você fecha a sua mente pra outras coisas você acaba se limitando e quem se limita não se expande, não cresce e isso não é de acordo com o que eu penso. Até porque a origem do Rap vem de outros estilos, né”.

Com todas essas influencias já tocou em banda de Hardcore e já cantou MPB. A banda se chamava Skin of Rate e misturava HC com Hip-Hop. Ele acredita que o Rap feito com banda não é um Rap legítimo, mas não deixa de ser Rap. Diz que o Rap verdadeiro é engajado e se une aos demais elementos do Hip-Hop (Break, Grafite e DJ).

Assim como grande maioria da galera da época começou a ouvir Rap na década de 90 através dos sons do Racionais Mc's e Thaíde e DJ. Hum. Apesar da TV veicular algumas músicas de rap norte-americano foi o rap nacional que o influenciou. O primeiro show de Rap que ele viu em Foz foi por acaso. Estava numa festa na Vila C e se deparou com o show do grupo Meninos do Rap da quebrada da Vila C. Aquilo o impressionou muito e depois daquele dia teve a vontade de um dia fazer Rap. Dez anos depois, no ano 2000 escrevia suas primeiras letras de Rap e saía pelas quebradas de Foz juntamente com a Banca CDR. Apresentou-se em diversas favelas, entre elas Favela do Bambu, Favela do Queijo e Cidade Nova. As suas letras falam do cotidiano, da violência, da discriminação, da desigualdade social e aborda também temas de psicologia interior e de filosofia. Titi fez parte do grupo Enquadro Verbal e participou do show de inauguração da Pista de Skate em Foz onde rolou o show do grupo paulista SNJ e do grupo de Porto Alegre Da Guedes. Ele ajudou em toda a correria para que a prefeitura viabilizasse a construção da pista, reuniu a galera, fez abaixo assinado, foi na prefeitura. Titi anda de Skate há mais de 15 anos e conta como foi difícil a concretização do projeto:

“A gente brigou muito, a gente correu atrás, porque a gente sabe que as autoridades públicas discriminam e não investem em esporte, ainda mais um esporte como o Skate que é marginalizado”.

A respeito das críticas que o Rap recebe por parte de pessoas que não entendem a mensagem ele diz que:

“O Rap veio da periferia, o Rap veio do submundo. Então naturalmente ele vai falar daquilo que ta acerca dele. Como o rap é um som da periferia ele tem que retratar o que é da periferia, entendeu. Conseqüentemente, eu acho que por isso ele vai falar da rotina do ladrão, do tiro, da morte, da violência, ele retrata o que ta perto dele, é isso que eu acho do rap nacional”.

E questionado se os manos do Rap Nacional trata a mulher com mais respeito do que o Rap gringo que expõe as mulheres como objetos de consumo ao lado de carros, jóias e bebidas, ele diz:

“Eu acho que o Rap nacional respeita um pouco mais, né, não que ele respeita 100%. Eu acho que ainda existe uma cultura do machismo no Rap e eu acho isso negativo, entendeu. Na sociedade de hoje não faz sentido você ser machista, a mulher ta conquistando cada vez mais seu espaço e a tendência no futuro é ela dominar”.

Um grande choque na sua vida foi quando perdeu seu pai com 11 anos de idade, isso transformou totalmente a sua vida. Muitas crianças de periferia não conhecem o pai, ou porque ele não assumiu a paternidade ou por ter morrido no crime ou nas drogas. Titi acredita que isso não é motivo para que no futuro quando essas crianças se tornarem pais, abandonarem seus filhos.

“O bom homem é aquele que não repete o erro, né, é aquele que transforma, que muda, né, e que dá exemplo. Eu acho que esse é o verdadeiro homem, se ele repetir o erro que o pai dele cometeu com ele mesmo ele vai ta sendo um inútil, eu penso assim, né”.

Hoje ele é casado e cria seus filhos com todo carinho. Titi diz que já foi muito discriminado e conta a razão por toda essa discriminação que o povo favelado sofre.

“Eu fui discriminado mais pela questão racial. Depois pela questão social, por que é uma realidade. Se você é pobre você é discriminado. Se você é um pobre preto você é discriminado mais ainda. E se você é um pobre preto e cantor de rap você é discriminado mais ainda.

Apoio Cultural

“Pra ser sincero eu acho que Foz do Iguaçu não tem apoio cultural nenhum, nunca teve. A nossa prefeitura nunca se importou de maneira alguma com qualquer manifestação cultural. Aqui sempre quem quis manifestar sua arte teve que correr pelas próprias pernas. Nunca investiram nada e eu acho que vai demorar muito pra ter alguém, algum político que tenha mentalidade de investir na cultura e na arte. Porque eles só querem saber do bolso deles, só querem encher cada vez mais o bolso deles e a gente vai ter que ta sempre contribuindo, pagando o nosso IPTUzinho pra eles ficarem cada vez mais ricos”.

Integração Latino-Americana

“Eu vejo que isso aí é mais um fruto da manipulação da TV porque não existe integração Sul América, MERCOSUL, isso não existe, isso é propaganda da TV. Nada é integrado aqui. Aqui é cada um por si. Aqui é terra de ninguém. Quem pode mais chora menos, então quem vai por propaganda ta se iludindo”.

Religião

“Eu sou cristão, já participei de igreja, já tive religião, mas hoje em dia eu procuro mais absorver a palavra de Deus, os ensinamentos e não me prender a religiosidade. Já freqüentei e às vezes eu ainda vou na igreja. O meu rap nunca foi gospel, eu sempre enxerguei ele como um rap positivista. É diferente do rap já citado, gangueiro, da violência, porque você tem que retratar aquilo que você viveu. Apesar de eu ter convivido com pessoas que teve uma vida violenta ligada ao crime, mesmo eu sendo uma criança que não teve privilégios na vida, mesmo eu sendo uma pessoa que nunca tive luxo em minha vida, desde pequeno eu fui educado a estudar, eu fui educado a correr atrás das coisas. Mesmo que em algum período da minha vida eu não deva ter corrido atrás quando meus pais quiseram, que foi um período, vamos dizer assim, obscuro da minha vida, eu sempre tive uma índole mais positiva do que negativa”.

Tem esperança de que Foz vai mudar?

“Eu acredito que vai mudar, a gente sempre tem que acreditar que vai mudar porque sem positivismo a gente não chega a lugar algum. A gente tem fé, eu acredito em Deus e Deus quer o melhor pra gente, então a gente tem que sempre acreditar que tudo vai melhorar e que tudo vai ficar bem”.

Sonho

“O meu sonho é viver e conseguir sustentar minha família com o suor do meu trabalho e ser feliz, né”.

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