sexta-feira, 9 de outubro de 2009

O POLICIAL MILITAR E A PIZZA (Por: Luiz Henrique)

Todos que me conhecem sabem de minha vida, até certo ponto, regrada. Não bebo, não fumo e não uso drogas. Não acho, porém, que sejam atitudes ruins, mas não faço, em primeiro lugar, porque geralmente sou motorista dos amigos e parentes nas festas e afins e, sendo assim, não gosto de estar fora de meu estado normal que, como sabem, não é tão normal assim. Além disso, utilizo o carro apenas quando tenho uma verdadeira necessidade, caso contrário vocês podem me ver, durante a semana, andando de bicicleta ou tentando me equilibrar no velho skate, sempre com um afinado discurso contrário ao uso do automóvel e contra a poluição ambiental. Meus alunos também sabem de minha luta para colocar na cabeça das pessoas que caminhar e andar de bicicleta são atitudes benéficas para a sociedade (e à saúde). Chego a ser chamado de chato e idealista, mas sigo minha vida tranquilamente, me esquivando das críticas.

Quando tenho necessidade, porém, uso o carro. Se o passeio é durante a noite, sempre me lembro de uma orientação vista por mim na televisão (no tempo em que eu via TV e morava em Porto Alegre): um comandante da Polícia Militar (lá chamada de Brigada Militar) orientando os motoristas a não pararem em semáforos de vias com pouco movimento depois das dez da noite, em função do risco de assaltos. Além disso, ressoa-me (sempre) uma definição aprendida na faculdade de Arquitetura dizendo “o semáforo serve para controlar os fluxos de pedestres e veículos”. Tais orientações sempre estão presentes no meu “manual de defesa pessoal” particular e as sigo à risca, pois foram ditas por um policial (para mim, um cidadão que deve ser ouvido) e por algum teórico do urbanismo moderno. Eu uso cinto de segurança, não estaciono em local proibido, respeito o limite de velocidade, a pista de ultrapassagem, a faixa de pedestres e a sinalização indicativa. Tudo para ajudar a amenizar o caos da cidade, causado pelos carros. E assim fiz na última terça-feira. Fui jantar em uma boa (e barata) cantina na Rua Almirante Barroso. Saí de lá por volta das dez horas da noite e fui à direção de minha casa. Com base em tudo isso, cheguei ao cruzamento na área central, vazio, deserto, e parei o carro, olhei bem para todas as vias e, na ausência de fluxo, passei o sinal vermelho (que em minutos começaria a piscar, liberando o tráfego, como sei) quando faltavam “duas bolinhas” para ficar verde. No próximo cruzamento, cuidadosamente, como não havia fluxos e a esquina estava escura e vazia (além de ser um ponto de concentração de traficantes de droga e assaltantes), passei novamente outro sinal vermelho, agora faltando uma “bolinha” para ficar verde. Foi então que ouvi uma sirene. Era uma viatura da Polícia Militar do Paraná. Prontamente, reduzi a velocidade e parei. Um policial gritou de dentro da viatura “Você não tem vergonha? Desça do carro!”. Atendi. Parei em frente a uma pizzaria. Ele saiu da viatura com uma pistola na mão e gritou “vai tirando o documento aí”. Atendi. Foi então que ele olhou nos meus olhos e disse “Você não tem vergonha de passar dois sinais vermelhos na frente da polícia? Você não respeita uma viatura?”.

Tive que falar, mas antes pedi para ele guardar a arma. Disse “O senhor desculpe-me. Não passei o sinal porque vi ou não vi a viatura da polícia. Passei o sinal porque é tarde da noite, tenho medo de assaltos e olhei se não viria ninguém”. Ele, ainda gritando, “Não tem desculpa. Você perdeu a carteira meu amigo!”. Tentei explicar que não era uma questão de respeito ou não a polícia. Não seria tão hipócrita de não fazer algo só porque vi uma viatura. Não sou assim. Não houve jeito. Fui multado e, segundo o guarda, deverei entregar minha carteira em breve. Durante todo o tempo ele foi muito estúpido comigo e me tratou como se eu fosse um bandido ou algo do gênero. Sei que é errado passar o sinal vermelho, mas confesso que esta é a mesma polícia para quem liguei várias vezes, para mim ou para ajudar outro cidadão, e não me atendeu.

O mais interessante de tudo isso é que, durante a abordagem (cerca de cinco minutos) o outro policial da ronda desceu do carro e foi até a pizzaria em frente ao local e, não sei como, voltou com uma pizza tamanho “gigante” e entrou na viatura. Eles foram em direção ao batalhão da PM, comer uma deliciosa pizza em horário de serviço. Talvez já tivessem feito a encomenda (ou não) e aproveitaram pra aplicar umas multinhas no caminho, gritar com alguém de bem e mostrar sua pistola automática para um carinha de óculos azul e que não faz mal a ninguém, só por ele ter medo da falta de segurança passar, tarde da noite, um sinal vermelho.

LUIZ HENRIQUE é escritor, estudante de Arquitetura e Urbanismo e comunista (convicto). Ele tem medo de contestar os policiais (mesmo quando tem razão), pois tem um amigo que foi preso, acusado de ter xingado um policial. O amigo, que estava com ele, não xingou, mas o policial mentiu e acabou conseguindo mandar o cidadão em cana. O Luiz é daqueles que acreditam na polícia, e a defende, mas tem momentos em que ele desanima.

Fonte: www.acasadohomem.blogspot.com

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