segunda-feira, 15 de fevereiro de 2010

NOVELA DA VIDA REAL

Mais um Cidadão José Cap. 47

O rapaz chegou com a garrafa de vinho e os copos que o Japão havia solicitado. O Japão encheu os copos e acenou para que eles se sentassem. Passou o copo para eles que tomaram como quem está com muita sede, em um gole só.

- Que enrascada vocês se meteram hein.

Pra sorte dos três, eles são conhecidos do Japão. Há um ano atrás organizaram um show de rap naquela quebrada e ficaram muito camarada da galera daquela favela, voltando outras vezes pra visitar os loko. No dia do show de rap rolou um freestyle, que é os versos improvisados na hora, no estilo dos repentistas e o mano Bira fez uma rima com o nome do Japão: “Um salvão de coração, pra esse mano bem lokão / Sem palavra aí tiozão, salve Japão”. Ele se encantou com a jogada de rima e desceu várias brejas pros malucos do Hip-Hop que estavam se apresentando no evento. Depois ficou firmado de ele patrocinar com um qualquer o CD dos malucos, quando eles estiverem gravando. Mas com o tempo eles se afastaram um pouco da quebrada por causa do clima de guerra que a favela estava respirando.

-Pois é tio. Polícia é foda. A gente tava no ato lá contra a violência de Estado e batemos de frente com eles. Mas os cana são vingativos, não agüentam no debate e partem pra violência memo.


- Então, tive que desenborçar 7 pica-pau. Os cara tava na febre de matar vocês. É uma grana hein. Vocês vão ficar me devendo esse troco.

- Então, a gente ta quebradeira, mas vamos fazer o corre, vê se conseguimos emprestar com alguém e tal.

- Eu tenho uma proposta pra vocês.

- Qual a cena tio?

- Se vocês agilizarem um lado pra mim, morre essa grana aí.

Os três se olharam e ficaram tentando imaginar o que ele queria que eles fizessem. Estava com um sorriso malicioso, como se tivesse com algum plano maléfico em mente. E onde eles conseguiriam 7 mil e quinhentos reais pra pagar a dívida, dinheiro não dá em árvore e os três estavam passando por dificuldades financeiras. A cidade de Foz do Iguaçu não está fácil pra ninguém que queira trabalhar decentemente. Centenas de pessoas estão indo embora da cidade em busca de seus sonhos, ou para estudar em uma universidade ou em busca de um emprego pra sua sobrevivência. A própria formação da cidade contribuiu para isso. Milhares de pessoas vieram pra Foz no final da década de 70 com a esperança de trabalhar na usina de Itaipu. Muitos dos que não conseguiram emprego na Itaipu foram morar nas favelas que hoje são dezenas. As ocupações eram totalmente desestruturadas, sem água encanada, energia elétrica, calçamento ou asfalto, sem nada, e muitas continuam ainda sem infra-estrutura até hoje. Passado o ciclo da construção da usina veio o ciclo do turismo de compra e muita gente passou a trabalhar no Paraguai, do outro lado da fronteira. Uma parte da população iguaçuense tirou dali seu ganha pão por muito tempo, seja trabalhando de laranja, passando mercadoria ou trabalhando nas lojas. Mas o governo brasileiro e paraguaio taxou os trabalhadores de contrabandistas e assegurando os interesses dos empresários capitalistas começaram a criar dificuldades, para travar o comércio informal dos produtos oriundos da China. As grandes empresas do Paraguai e do Brasil estavam perdendo muito dinheiro, pois a galera comprava produtos no Paraguai 3, 4 vezes mais baratos do que seus preços. O arrocho e a perseguição aos ditos muambeiros culminou na queda de 70% do movimento nas lojas do Paraguai, o que resultou em demissão em massa dos iguaçuenses que trabalhavam ali.


(Lizal. Na próxima edição mais um capítulo)

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