segunda-feira, 15 de fevereiro de 2010

Saudade... (Por: Carol)

Três cervejas e já te escrevo...

“No entanto, saudade não é senão uma nova forma, polida pelas lágrimas, da palavra soledade, solidão” (Joaquim Nabuco)

Meu lado saudosista desperta depois de três cervejas. Abro minha bolsa, tiro meu caderninho e lá vou eu...

Saudade dos que se foram, dos que irão... Saudade das tardes de criança, que passaram e não voltarão... Saudade... Não bastava o termo no singular, maior ainda, o plural. Saudade acrescida de um S, que transforma o pouco que era muito, num muito sem final.

Saudade, saudades...

Li em um livro que esse sentimento é universal, mas que em todos os lugares do mundo para se descrever tal sentimento as pessoas precisam de mais uma, duas, até mesmo, três palavras. Temos saudade do “tido” e daquilo que pretendemos ter. Sentimos saudade de um cheiro, um sabor, um tempero, saudade de coisas que não vivemos, saudade de coisas que os outros viveram, sentimos saudade até dos nossos próprios sentimentos...
Saudade, saudades...

Essa palavra, como diz Damatta, “é mais do que uma mera palavra”. Ela é pura lembrança, ela é “a própria realidade da idéia que exprime”. Ela é “concepção de um tempo especial, tempo que deseja ser moderno mas sem abandonar sua qualidade humana e relacional”.
E o que é esse tempo que hoje temos associado à produção econômica e à quantidade de riqueza acumulada? Um tempo preciso, pontual, valioso... Tempo controlado pelo homem, pelos ponteiros de um relógio, em sua duração. Tempo que não pode ser desperdiçado com um passeio no bosque, com um piquenique no fim de semana, um tempo que não nos permite sentirmos nossos sentidos. Permite-nos ser um pacote de carne e osso que vive em função de um pedaço de papel, pois ali mora a felicidade.

Saudade... Sentimento atemporal... É como se fosse uma viagem no tempo. Você pode estar aqui e estar lá no passado.

Esse ponto que usamos no pulso, marca um tempo diferente do que a nossa mente marca. Esse relógio que nos diz quando sorrir, quando chorar, quando dizer que ama, quando dizer que sente saudade...

Eu, particularmente, gosto de sentir saudade... E acho que você também deve gostar... De lembrar de coisas que aconteceram que marcaram nossa memória... Gosto de lembrar da torta de maçã que comíamos quando viajávamos para Assunção. Gosto de sentir o cheirinho suave do doce de figo da vó Ana... Gosto de lembrar de quando morávamos em Ponta Grossa, acordávamos cedo e abríamos a janela da cozinha da casa da minha falecida vó, colhíamos os figos, e ela fazia o melhor doce que já tínhamos provado. Gosto de lembrar dos passeios até a beira do rio. Das roupas sujas de terra, dos tênis brancos que voltavam pretos... Gosto de lembrar das coisas que encontrávamos nas nossas expedições pelos lados do Porto Dourado... A mais bizarra que encontramos e levamos para casa foi a ossada da cabeça de um boi. Essa expedição, diga-se de passagem, nos rendeu algumas chineladas... Gosto de poder me enganar e sair desse mundo. Uma doce viagem pelo tempo, pelo tempo dos meus sentidos... Tempo esse que aprendeu a deixar todas as tristezas e as dores escondidas debaixo do tapete da memória. Não quero lembrar de todas as brigas, todas as coisas ruins que aconteceram na minha vida... Quero ter certeza que vivi, que sofri, mas que estou aqui hoje firme e forte...

*Citações do livro de Roberto da Matta “conta de mentiroso-sete ensaios sobre antropologia brasileira” editora Rocco

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