segunda-feira, 7 de setembro de 2009

“Na cara da Madame, Na cara do Patrão”...

As peripécias da “Geração Cifrão”. (Por Lizal).

A música Geração Cifrão do rapper 'Funkero' tem um quê de ousadia. Num jogo de rima muito bem articulado, no estilo underground, a música rompe com os rap's comportadinhos e higienizados que os empresários e a mídia investem hoje em dia. A música já começa bem doida com um refrão ritmado e bem rimado que quem ouve a primeira vez já aprende a cantar:

“Geração Cifrão, a Geração Canhão
Vai gerar uma ação, invadir sua mansão
Antes que vocês perguntem: “Quem vocês são?”
Nós já demos por encerrada e completa a missão”.

A música é cantada por 4 rappers e narra um assalto a uma mansão. Cada rimador narra de forma diferente o assalto, como se fossem todos de quadrilhas diferentes, para dar a impressão de que existem vários assaltos a mansões acontecendo ao mesmo tempo.

Narrador 01:

“Nunha fração de segundo, um monte de vagabundo
psico, periculoso, treinado no submundo
Os cara que vão pra cima, igual eu pronto pra rima
Seu condomínio sobre o meu domínio eu dou o clima (..)”.

Narrador 02:

“Questão de reapropriação, redistribuição de bens
Suas jóias em Liverton, toda grana do cofre também
Fortuna em fuga na madruga e amanhã na favela tem
Churrasco e doce pras crianças se aqui correr tudo bem (...)”.

Narrador 03:

“Bicos engatilhados, conflitos armados, baralho marcado
Jogo mandado, olha os trincados, dentes cerrados
Errado, quem quer o melhor? Então também quero
Perdeu, levo seus dólares, Rolex, sem lero-lero
Sem pena, sem trauma (...)
Fala pro presidente que inverteu a situação (...)”.

Narrador 04:

“Esse é o Brasil que o povo nunca discutiu
Geração reprimida que a ditadura produziu
Século do medo, vivendo a lei da rua
A revolta continua, a repressão continua
Enquanto latifundiários darem tiro em sem-terra
Cada vez mais vai ter gente preparada pra guerra
Desordem e regresso desde os tempos de Lampião
Nas cidades do Brasil e pelo grande sertão
Perdeu patrão, se se mover eu te furo
Vou levar tua Mercedes, se vira aí com o seguro
Larga a grana, mete o pé sem reclamação
Essa é sua contribuição pra Geração Cifrão”.

Num segundo refrão todos cantam juntos, dizendo que os oprimidos se voltarão contra os opressores e acabarão com essa escravidão não anunciada:

“Se tu me explora de dia, eu te roubo de noite
Aguarde que um dia a gente vinga o açoite”.

O Rap no Brasil trouxe uma grande contribuição para a discussão da questão social. Essa música “Geração Cifrão” (por exemplo), traz à tona a crítica sobre a sociedade de consumo em que vivemos. Ao mesmo tempo em que somos explorados em nossos trabalhos (isso quando temos um emprego), a televisão nos mostra carros, mansões, jóias, restaurantes chiques e tudo o mais que nossos salários de miséria não podem comprar. Enquanto não temos acesso livre à Universidade (e mesmo quem se forma muitas das vezes não consegue trabalho), a TV nos mostra uma chance de ascensão social através da Mega Sorte, Tele Sena e dezenas de outras loterias com seus prêmios milionários.

Vivemos num país onde se criminaliza a pobreza, onde o braço armado do Estado invade as favelas e impõe suas próprias leis, reafirmando as ações de uma Elite que criou uma cultura que diz que a periferia é um lugar sujo, feio, onde só tem ladrão, vagabundo e traficante. É bem mais fácil e mais cômodo dizer que bandido tem que morrer, pedir pena de morte, redução da maioridade penal, do que discutir as causas de todas as desigualdades e trabalhar para reverter a situação. Quem vive nas periferias e favelas vive nas piores condições, as piores escolas, os piores postos de saúde e hospitais, em casas sem estrutura, sem acesso á cultura e lazer, sem acesso á biblioteca e internet. O transporte público é caro e de péssima qualidade, o salário não dá nem pra comida direito. Essa geração reprimida, esquecida e abandonada pelo poder público é incitada a ter também esse poder de consumo que a mídia mostra. Como não tem, nem sempre fica calada ou parada.

Enquanto esse Estado for excludente, não cumprir com o papel que se propôs e não dividir a riqueza com seu povo, a Geração Cifrão estará em ação.

Já passou da hora do povo se levantar e invadir as ruas, se unir e construir coletivamente uma nova sociedade, um novo Brasil que seja “para todos” realmente.

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